Confessando a carne em Grande Sertão:
veredas
Denise
Carrascosa
Doutoranda pelo ILUFBA; Professora de
Literaturas
de Língua Inglesa da UNIME
Resumo
Este artigo articula um estudo crítico da narrativa de Grande
sertão: veredas a um investimento metacrítico sobre alguns
discursos que, historicamente, construíram um certo imaginário do
corpo sexuado, desde a biologia do século XVIII à psicanálise
freudiana no início do século XX. A hermenêutica que se faz da
narrativa investe na potência desconstrutora da análise da localização
do personagem Diadorim como corpo-simulacro, que desestabiliza alguns
centros estruturais representados nas imagens dos demais corpos
circulantes, construídos para gerar um efeito de cenário estático,
contra o qual se projeta a dinâmica desta personagem. A construção
crítica desta sistemática de representação literária movimenta-se a
partir do lugar-olhar do narrador Riobaldo, que estrutura o seu
entorno e se estrutura como sujeito a partir de uma certa tecnologia
cristã de subjetivação: a confissão.
Palavras-chaves:
Grande sertão: veredas; Crítica; Corpo; Confissão.
Abstract
This article articulates a critical study of the narrative of
Grande sertão: veredas to a metacritical investment in some
discourses that have historically constructed a certain imagery of the
sexed body, from the eighteenth century’s biology to the Freudian
psychoanalysis at the beginning of the nineteenth century. The
hermeneutics of narrative invests in the deconstructionist power of
the analysis that places the character Diadorim as a simulacrum body
that unsettles some structural centers represented by the images of
the other circulating bodies, constructed to generate a static
scenario effect, towards which the dynamics of this character is
projected. The critical building of this literary representation
system is oriented from the look place of the narrator Riobaldo, that
structures his surrounding and himself as a subject based on a certain
Christian technology of individualization: confession.
Key-words:
Grande sertão: veredas; Criticism; Body; Confession.
Introduzir é pôr as
cartas na mesa
Este artigo articula
um estudo crítico da narrativa de Grande sertão: veredas a um
investimento metacrítico sobre alguns discursos que,
historicamente, construíram um certo imaginário do corpo sexuado,
desde a biologia do século XVIII à psicanálise freudiana no início do
século XX. A hermenêutica que se faz da narrativa investe na potência
desconstrutora da análise da localização do personagem Diadorim como
corpo-simulacro, que desestabiliza alguns centros estruturais
representados nas imagens dos demais corpos circulantes, construídos
para gerar um efeito de cenário estático, contra o qual se projeta a
dinâmica desta personagem. A construção crítica desta sistemática de
representação literária movimenta-se a partir do lugar-olhar do
narrador Riobaldo, que estrutura o seu entorno e se estrutura como
sujeito a partir de uma certa tecnologia cristã de subjetivação: a
confissão.
No interior desse
horizonte epistemológico, até aqui apenas insinuado, a narrativa de
Grande sertão: veredas foi selecionada para análise por uma
questão de política crítica. Não há, na crítica literária brasileira
“autorizada” sobre a obra de Guimarães Rosa, a não ser por alguns
acenos, referência à relação de desejo carnal, homoerótica em alguns
momentos, homofóbica em outros, que se pinta nas zonas de sombra na
narrativa roseana.
No prefácio da
coletânea Guimarães Rosa: ficção completa, lançada pela editora
Nova Aguilar em 1994, Eduardo Coutinho acentua o caráter formalista da
fortuna crítica roseana, sinalizando o tom dos ensaios críticos que o
sucedem e sua ênfase no sentido estilístico da obra de Rosa. Ademais,
em nossa revisão bibliográfica do que se tem escrito
contemporaneamente na academia, os títulos mesmos dos livros
publicados constituem índices de uma certa tipologia “geral” da
inserção crítica em Grande sertão: veredas, constituída por uma
abordagem metafísico-formalista: João Guimarães Rosa: metafísica do
Grande Sertão; o O:
a ficção da literatura em Grande sertão: veredas; João Guimarães Rosa
e a saudade; Guimarães Rosa: fronteiras, margens, passagens; Um
lugar do tamanho do mundo: tempos e espaços
da ficção
em João Guimarães
Rosa; A astúcia das palavras: ensaios sobre Guimarães Rosa.
A própria crítica
literária homoerótica brasileira parece também não querer aventurar-se
a desestabilizar a entronização que, durante décadas, vem sendo
promovida a partir de leituras que perpetuam a obra em suas
referências metafísicas. A revisão bibliográfica, empreendida nesta
seara de estudos, permitiu o encontro com uma vasta produção acadêmica
brasileira, embora recente (entre o final dos anos 90 e este início de
século), que analisa inúmeras obras da nossa literatura, sobretudo as
contemporâneas, a partir do instrumental dos estudos de gênero e dos
estudos gays e lésbicos, mas que não ousa referir-se a Grande
sertão: veredas. Este fato é sinalizado por João Silvério Trevisan
em Devassos no paraíso. Fato que pude constatar em minha
participação no II Congresso Internacional da ABEH (Associação
Brasileira de Estudos Homoeróticos), realizado na UNB em junho de
2004, conforme seus anais, bem como, no IX Congresso Internacional da
ABRALIC, realizado na URGS em julho de 2004, em seu simpósio
Erotismo e escrita – processos de subjetivação.
Quanto aos periódicos
consultados, refiro-me, dentre outros, aos Cadernos Pagu,
revista do Núcleo de Estudos de Gênero da Unicamp, à revista
Gênero, do Núcleo Transdisciplinar de Estudos de Gênero da UFF, e
mesmo à revista Gragoatá desta mesma universidade, publicada no
segundo semestre de 1997, intitulada Figurações do gênero e da
identidade.
Grande sertão:
veredas
foi publicado por João Guimarães Rosa, em maio de 1956 e inscreve-se
na ruptura da tradição literária brasileira. A partir de então,
tornam-se constantes as menções à “revolução” que Guimarães teria
empreendido na linguagem ficcional, o “corte” no discurso tradicional
da ficção brasileira em relação à linguagem, etc.,etc. Neste cenário,
passa a ocupar uma posição simbólica paradigmática no imaginário dos
estudos literários brasileiros. A ausência de intervenção crítica
sobre o Grande Sertão pelo viés discursivo dos estudos queer
parece contraditória em relação à proposta desconstrucionista e
descentradora do campo, especialmente se considerarmos que esses
estudos já mencionaram obras anteriores e posteriores à rosena.
Neste sentido, este trabalho propõe uma leitura
da narrativa seminal da identidade autoral de Rosa, que imprima a uma
das dimensões da análise o sentido da visibilização de questões de
relevância ideológico-política, no discurso crítico sobre obras
“canônicas”. Será abordado, portanto, o problema das representações do
corpo sexuado que geram vetores de reforço e/ou resistência a um
discurso matricial ocidental, instaurador da sexualidade dos corpos
sociais.
Com esta motivação, a
intervenção crítica sobre a narrativa de Grande Sertão, que
aqui recortamos, sistematiza alguns dos conceitos de Michel Foucault e
Judith Butler sobre sexualidade e corpo, buscando torná-los rentáveis
na construção da análise em dois momentos que se sucedem. O primeiro
articula a teoria foucaultiana da confissão como forma
discursiva ao formato narrativo de alguns corpos-personagens, aqui
chamados de “confessáveis”. O segundo pensa a personagem Diadorim como
sujeito “inconfessável”, a partir da articulação de sua narrativa à
noção de Butler de “produção de sujeitos inteligíveis”, a contrastar
com um fundo que gera sua ininteligibilidade e, por isso mesmo, sua
nitidez.
Confissão e produção discursiva do sujeito de desejo ocidental
A carne é a própria subjetividade do corpo, a carne cristã é a
sexualidade presa no interior dessa subjetividade, dessa sujeição do
indivíduo a ele mesmo, e este foi o primeiro efeito da introdução do
poder pastoral na sociedade romana.
Michel Foucault.
A contrapelo de uma
história tradicional da sexualidade ocidental, Michel Foucault, em sua
obra inacabada, História da sexualidade, tece esta narrativa a
partir de duas objeções fundamentais. A primeira delas argumenta a
favor de escrever uma história da sexualidade a partir dos vetores de
força que a impulsionaram, em lugar de tomar como forças
paradigmáticas suas pretensas fontes de proibição. A segunda delas
objeta o processo naturalizante de uma narrativa histórica que
estabelece o cristianismo como fonte primária de toda moral
repressiva, antes fazendo compreender o mundo helênico como espaço em
que as forças que organizariam posteriormente a repressão já
circulavam de forma embrionária. Nesse deslocamento, portanto, defende
Foucault a tese de que o cristianismo não teria sido responsável pelo
aporte de novas interdições morais à dinâmica social. Seu papel teria
sido o da instauração, no mundo helênico, de novas “técnicas de si”,
técnicas de produção de sujeitos, a integrar uma história da moral
sexual a partir dos primeiros séculos da era cristã. (FOUCAULT, 2003,
p. 63 - 64).
No âmbito dessa nova tecnologia, ganha força a
figura do pastorado, como poder oblativo, sacrificial, individualista,
que se orienta por uma necessidade de salvação, obrigação individual,
que só pode se dar num processo de intermediação entre o divino e um
outro. Esse outro, o pastor, está autorizado a exigir uma obediência
cega e total, porque o processo de culpabilização do indivíduo lhe
coloca na posição de vigiar e intermediar a punição (FOUCAULT, 2003,
p. 65-70). A obediência, portanto, é outra figura de fundamental
importância dentro do sistema de pensamento cristão, que já tinha seu
vetor de força esboçado na relação mestre/discípulo do mundo helênico.
No mundo cristão, o pastor concentra o
conhecimento dos mandamentos de Deus e, a fim de orientar suas ovelhas
no sentido da salvação, precisa conhecer sua interioridade, o que se
dá pelo mecanismo da confissão – exame de consciência que leva à
produção de uma verdade interior, que só pode se dar via pastor. A
figura da confissão se estabelece, portanto, como técnica de si de um
sujeito cristão que vai se tornando cada vez mais cheio de uma
interioridade espiritual, a qual deve dar a conhecer a fim de poder
dominar a dimensão material, associada ao mal materializado na imagem
da carne. O ato de confissão, em última instância, trata de desalojar
de si o poder daninho do mal (FOUCAULT, 2003, p.70).
Mediante a tecnologia
de subjetivação cristã de volta para um interior e para a tomada de
consciência sobre os desejos do corpo, a serem vistos como fraquezas
em face de uma espiritualidade pura a ser alcançada, a carne cristã
passa a ser a sexualidade presa no interior de uma subjetividade. O
imaginário de uma ars sexualis, regida por princípios de
prazer, verte-se em desejo a ser reprimido, como resultado da
sujeição do indivíduo a ele mesmo. Configura-se, então, a associação
do desejo a uma força maligna contra a qual o sujeito deve lutar para
alcançar uma verdade espiritual e alta.
Em seu volume I da
História da sexualidade, Foucault desenvolve uma teorização
que se orienta no sentido da negação da hipótese repressiva, segundo a
qual o desenvolvimento do capitalismo no século XVII teria restringido
rigorosamente os atos e falares sexuais ao sacrossanto espaço da
família burguesa, em suas necessidades de reprodução. Colocando uma
série de questões à suposta Idade da Repressão, o texto foucaultiano
desconstrói a lógica das proibições, recusas e negações vitorianas,
para entender ali uma tática de proliferação discursiva eivada de uma
vontade de saber sobre o sexo, que serve de suporte e instrumento à
governabilidade dos corpos (FOUCAULT, 2001, p. 9-18).
Entre discursos
demográficos, pedagógicos, médicos, psiquiátricos e jurídicos sobre a
sexualidade, o jogo católico da confissão
se intensifica como técnica meticulosa de exame de si na qual tudo
deve ser dito: a
colocação do sexo em discurso se articula à suposição do despropósito
sexual como peças de um mesmo dispositivo na figura da confissão, uma
forma discursiva que durante séculos teria encerrado a verdade do sexo
e conformaria a matriz geral a reger a produção do discurso verdadeiro
sobre o sexo (FOUCAULT, 2001b, p. 61-62).
A partir da
intersecção de duas modalidades de produção da verdade: os
procedimentos da confissão e a discursividade científica, analisa
Foucault o surgimento do discurso psicanalítico no século XIX:
scientia sexualis que operaria através da codificação clínica do
fazer falar, ciência-confissão que assumiria como método o
ritual da confissão e como objeto o inconfessável confesso (FOUCAULT,
2001b, p.63-64).
A partir dessa lógica operacional de
poder-saber, seria desenvolvida uma certa teoria geral do sexo no
século XIX, a engendrar um dispositivo da sexualidade, encarnado no
corpo em termos de elementos anatômicos, funções biológicas, condutas,
sensações e prazeres. Essa unidade discursiva artificial faria
funcionar o corpo como ponto de captação dos discursos que se
multiplicavam sobre o sexo (FOUCAULT, 2001b, p.144-146).
Neste mapeamento da
obra de Foucault em torno da questão da sexualidade, pode-se perceber
a figura do corpo, no texto foucaultiano, desconstruída quanto à sua
associação à carne cristã, ao mal, ao desejo que se deve conter, a uma
verdade escondida, profunda, a uma interioridade que precisa ser
purificada via confissão. O corpo ainda é o resultado de um processo
de subjetivação na trajetória estética de constituição de um homem de
desejo, que Foucault desenha a partir de certa tecnologia de si, da
cena helênica à cristã.
Corpos confessáveis nas veredas roseanas
Em Grande sertão:
veredas, a vontade da narrativa busca o corpo como via de
compreensão da experiência, de percepção do real. A narrativa
constitui uma retravessia da experiência pela memória, que busca a
apreensão do vivido pelo narrado. É a partir da revelação de um corpo
feminino sob o signo do masculino que a narrativa precisa iniciar,
para tentar compreender a articulação dos signos da identidade social,
sexual e corpórea. Deste ponto, os signos do corpo serão a teia no
interior da qual a experiência do vivido será narrada.
Na tentativa de decifração dos sinais do corpo, a memória opera
– essa memória, rede de discursos histórico-culturais.
A verdade de um corpo se quer ver confessada pela
voz de Riobaldo; querer movido por uma força de vontade de revelação
de uma verdade escondida, a verdade da compreensão da experiência,
compreensão que se opera a partir dos signos do corpo: “Eu vivia com
meu bom corpo. Alguém há de achar algum regime melhor? (ROSA, 1982,
p.95)
Confissões da carne
A confissão é um ritual de
discurso onde o sujeito que fala coincide com o sujeito do enunciado;
é, também um ritual que se desenrola numa relação de poder, pois não
se confessa sem a presença ao menos virtual de um parceiro, que não é
simplesmente o interlocutor, mas a instância que requer a confissão,
impõe-na, avalia-a, intervém para julgar, punir, perdoar, consolar,
reconciliar; um ritual onde a verdade é autenticada pelos obstáculos e
as resistências que teve de suprimir para poder manifestar-se; enfim,
um ritual onde a enunciação em si , independentemente de suas
conseqüências externas, produz em quem a articula modificações
intrínsecas: inocenta-o, resgata-o, purifica-o, livra-o de suas
faltas, libera-o, promete-lhe a salvação [...]. Não se trata somente
de dizer o que foi feito – o ato sexual – e como, mas de constituir
nele, ao seu redor, os pensamentos e obsessões que o acompanham, as
imagens, os desejos, as modulações e a qualidade do prazer que o
contém
Michel Foucault
A voz narrativa de
Riobaldo se introduz no amplo espaço do sertão, buscando caminho para
a compreensão de uma verdade. Nesse trajeto, anuncia desde já uma voz
de interlocução silente: “O senhor tolere, isto é o sertão” (ROSA,
1982, p.9). Esta escuta que permeia todo o processo narrativo se impõe
a cada “senhor” invocado como instância de consentimento, de
avaliação, de culpabilização, de absolvição. Permite a relação
mestre/discípulo, pastor/ovelha, confidente/penitente, único processo
possível para o alcance da verdade que se busca revelar.
O
narrador, em contra-ponto, ao posicionar o interlocutor como voz de
assentimento e interdição, ocupa o local do servidor que se diz dócil
e obediente; mas, na relação de negociação entre a fala e o silêncio,
o discurso prevalece e o silenciado se conduz à revelação de uma
verdade. O narrador, portanto, voz passiva e ativa nos caminhos pelos
quais envereda, vai também construindo sua verdade de si no processo
do contar:
Medo de errar. Sempre tive. Medo de errar é que é
a minha paciência. Mal. O senhor fia. Pudesse tirar de si esse
medo-de-errar, a gente estava salva. O senhor tece? Entenda meu
figurado. Conforme lhe conto: será que eu mesmo já estava pegado do
costume conjunto de ajagunçado? (ROSA, 1982, p.142).
E neste
processo narrativo-confessional, o contar histórias passa a ser vereda
para o saber. A narrativa se posiciona na mesma altura da ciência, da
religião, da filosofia, como processos de conhecer que vão
significando a experiência do real:
O senhor saiba: eu toda a minha vida pensei por
mim, forro, sou nascido diferente. Eu sou é eu mesmo. Divêrjo de todo
o mundo... Eu quase que nada não sei. Mas desconfio de muita coisa. O
senhor concedendo, eu digo: para pensar longe sou cão mestre – o
senhor solte em minha frente uma idéia ligeira, e eu rastreio ela por
fundo de todos os matos, amém! [...] Eu cá não perco ocasião de
religião. Aproveito de todas. Bebo água de todo rio... Uma só, para
mim é pouca, talvez não me chegue. (ROSA, 1982, p.15).
A
narrativa, assim como outros saberes, é tecida como via de acesso ao
conhecimento, a uma investigação de idéia que se perscruta, mas que
também se tece à rede discursiva. O saber não figura apenas verdade a
ser iluminada em um lugar obscuro. A verdade é feita da mesma matéria
da busca. O conhecimento se dá na própria “travessia” e não fora dela.
O conhecimento que se persegue estrutura o próprio saber numa lógica
hermenêutica em que tudo é discurso. Por essa razão é que a narrativa
de Riobaldo não tem forma fixa; à semelhança do sertão, não se encerra
dentro de uma única lógica; é narrativa em cuja textura se busca
imprimir o sistema de como as coisas se dariam no real: sem forma
racional, que a linguagem faz caber no pensável:
A lembrança da vida da gente se guarda em trechos
diversos, cada um com seu signo e sentimento, uns com os outros acho
que nem não misturam. Contar seguido, alinhavado, só mesmo sendo as
coisas de rasa importância. De cada vivemento que eu real tive, de
alegria forte ou pesar, cada vez daquela hoje vejo que eu era como se
fosse diferente pessoa. Sucedido desgovernado. Assim eu acho, assim é
que eu conto. (ROSA, 1982, p.78).
Esta
narrativa sem centro epistemológico ou ontológico pulsa na mesma
freqüência da memória do corpo, relembrando suas sensações e
estruturando-se a partir de sua lembrança:
Mesmo o que eu estou contando, depois é que eu
pude reunir relembrado e verdadeiramente entendido – porque enquanto
coisa assim se ata, a gente sente mais é o que o corpo a próprio é:
coração bem batendo. Do que o que: o real roda e põe diante – “essas
são as horas da gente. As outras de todo tempo, são as horas de todos”
(ROSA, 1982, p.108).
[...] sucedia uma duvidação, ranço de desgosto:
eu versava aquilo em redondos e quadrados. Só que coração meu podia
mais. O corpo não traslada mas muito sabe, advinha se não entende
(ROSA, 1982, p.26).
A memória que se
representa no fiar da narrativa vai buscando o corpo na compreensão
das experiências passadas,
um corpo que se apresenta carne no
desejo de sangue: “a
gente viemos do inferno [...] duns lugares inferiores, tão
monstro-medonhos [...] as ruindades de regra que executavam em tantos
pobrezinhos arraiais: baleando, esfaqueando, estripando, furando os
olhos, cortando línguas e orelhas”
(ROSA, 1982, p.40).
Desta carne que se
fala, de uma carne que se pensa em um espaço inferior e baixo, desta
carne se origina a vontade de saber da narrativa, que por meio dela se
conduz, no sentido de uma alta verdade. O inferior e o superior
dialogam numa relação de simbiose em que um não sobrevive sem o outro,
nas vozes de silêncio e fala, de esquecimento e memória. A compreensão
da simbologia do corpo perfaz via de acesso à verdade de sua
construção histórica. Para a vontade de saber na narrativa de
Grande sertão: veredas,
a memória da carne é vereda que atravessa a verdade vazia do sertão.
Construção de corpos sexuados em narrativa
Mas o
senhor releve eu estar glosando assim a seco essas coisas de se calar
no preceito devido. Agora: o tudo que eu conto, é porque acho que é
sério preciso
João Guimarães Rosa
Os corpos
sexuados, projetos de fronteira para identidades culturais e desejos,
circulam na narrativa de Riobaldo nas suas mais diversas formas, em
imagens que reproduzem ou representam o imaginário discursivo de
construção histórico-cultural do sexo, como categoria cultural,
encarnado nos corpos que experimentam o real.
No sentido
de uma “bio-lógica” de ontologização dos corpos sexuados como matéria
natural e anterior a toda palavra cultural, atravessam a narrativa
corpos rijos de jagunços, em imagens que associam sua masculinidade à
ordem da natureza:
[...] nunca vi cara de homem fornecida de bruteza
e maldade mais, do que nesse. Como era urco, trouxo de atarracado,
reluzia um cru nos olhos pequenos, e armava um queixo de pedra,
sombrancelhonas; não demedia nem testa. Não ria, não se riu nem uma
vez; mas falando ou calado, a gente via sempre dela algum dente, presa
pontuda de guará. Arre, e bufava um poucadiinho. Só rosneava curto,
baixo, as meias palavras encrespadas. (ROSA, 1982, p.17).
Nesse
sentido, o corpo vai ganhando consistência e cor nas batalhas travadas
entre homens. O corpo vira carne, ossos e sangue nas pelejas do ofício
de jagunçagem e, embora a ruína do corpo masculino pela doença seja
representada, a força do macho não se desmancha na memória narrativa,
não se desarticulando de sua rigidez natural:
A
ser que Medeiro Vaz, por esse tempo, já acusava doença a quase acabada
– no peso do fôlego e no desmancho dos traços. Estava amarelo
almecegado, se curvava sem querer, e diziam que no verter água ele
gemia. Ah, mas outro igual eu não conheci. Quero ver o homem deste
homem!... Medeiro Vaz – o Rei dos Gerais. (ROSA, 1982, p.51).
O poder de
fogo do homem, sua potência de guerra e combate se associam a imagens
masculinizadas do corpo natural, do corpo que mimetiza jeitos de
bichos:
O ar todo do campo cheirava a pólvora e a
soldados. Diante de mim, nunca terminava de atar as correias do gibão
um Cunha Branco, sarado, cabra velho guerreiro: ele boiava língua em
boca aberta. (ROSA, 1982, p.56).
Respirei: a gente sorvia o bafejo – o cheiro de
crinas e rabos sacudidos, o pêlo deles, de suor velho, semeado das
poeiras dos sertão [...] Ali deviam estar alguns dos homens mais
terríveis sertanejos (ROSA, 1982, p.92).
Os
jagunços, em sua preparação para o combate, corpos rijos conduzidos
pela pulsão de adentrar a aridez do sertão e prostituir a sua pureza,
deixam seus rastros de sangue, que fecundam o chão de morte e de vida,
mas antes afiam os próprios dentes, como feras:
Pois não era que num canto, estavam uns
permanecidos todos se ocupando num manejo caprichoso, e isto que eles
executavam: que estavam desbastando os dentes deles mesmos,
aperfeiçoando os dentes em pontas! [...] a poder de gume de ferramenta
por amor de remedar o aguçoso de dentes de peixe feroz do rio de São
Francisco – piranha redoleira [...] às vezes sangue babava (ROSA,
1982, p.127).
E para
matarem o instinto da fome do corpo, comem corpos de outros bichos,
que estripam, retalham, sangram, penetrando com seus punhais a carne
morta que aguarda passiva e feminina: “iam ajudar a retalhar o porco,
porção que se levava dali, em carne e toucinhos” (ROSA, 1982, p.185).
Num
movimento inverso, a própria terra se revela em sua natureza humana,
executando movimentos sensuais de um corpo seco, mas ardiloso, um
corpo representado com um sentido de aridez que oculta uma
profundidade, o corpo-terra da mulher sertaneja:
O chão deles consiste duro enxuto, normal que
engana; quem não sabe o resto, vem, pisa, vai avançando, tropa com
cavalos, cavalama. Seja sem espera, quando já estão no meio do
caminho, aquilo sucrepa: pega a se abalar, ronca, treme escapulindo,
feito gema de ovo na frigideira. Ei! Porque, debaixo da crosta seca,
rebole ocultado um semifundo, de brejão engulidor (ROSA, 1982, p.54).
A respeito
de um certo imaginário de corpos sexuados que formata as relações
sociais do sertão, o falo aparece como símbolo de macheza e de
coragem, da própria vida do jagunço: “Me dá saudade é de pegar um
soldado e tal, pra uma boa esfola, com faca cega... Mas, primeiro,
castrar...” (ROSA, 1982, p.20)
O
imaginário de complementaridade dos sexos opostos, em suas forças de
penetração e recepção, em seus princípios de atividade e passividade,
respectivamente masculino e feminino, geram imagens que se apresentam
homofóbicas na narrativa de Riobaldo:
Saem dos mesmos brejos – buritizais enormes. Por
lá sucuri geme. Cada sucuruiú do grosso: voa corpo no veado e se
enrosca nele, abofa – trinta palmos! Tudo em volta é um barro colador,
que segura até casco de mula, arranca ferradura por ferradura. Com
medo de mãe-cobra, se vê muito bicho retardar ponderado, paz de hora
de poder água beber, esses escondidos atrás das touceiras de
buritirana (ROSA, 1982, p.27).
A
impossibilidade da junção das valências positivas é estéril e resulta
em morte, o que gera sua fobia e esconderijo na sombra.
A figura
do incesto ainda aparece na narrativa, em uma imagem de proibição
social associada ao castigo corporal, como ponto de inserção de
punição por uma força metafísica:
Pois essa história foi espalhada por toda parte,
viajou mais, se duvidar, do que eu ou o senhor, falavam que era sinal
de castigo, que o mundo ia se acabar naquele ponto, causa de, em
épocas, terem castrado um padre, ali perto umas vinte léguas, por via
do padre não ter consentido de casar um filho com sua própria mãe.
(ROSA, 1982, p.59).
O crime,
interdição do incesto, categoria cultural, é vinculado à perda de
parte do próprio corpo – o falo, como potência de vida, de ascendência
social de um sobre outros. Corpo e cultura encontram-se, então,
definitivamente vinculados.
O corpo do
homem tem em sua simbologia extensões que o extrapolam, mas o
continuam: “Que eu não entendia de amizades, no sistema de jagunços.
Amigo era o braço, e o aço!” (ROSA, 1982, p.138). Braço, como dado
fisiológico, e aço, como produto culturalmente modificado, estão aí
interligados no mesmo signo da afetividade e da masculinidade.
Os
instrumentos, que figuram a imagem do falo, do seu poder de força e
penetração, mediam o processo de subjetivação sexual do menino, que
apreende um papel social masculino, pela posse dos objetos fálicos, o
que articula mais uma vez corpo e identidade sexual.
Os nomes dos jagunços
são ainda extensão de seus corpos sexuados, que se perpetuam na
memória do sertão com uma potência bélica: “Meu nome d’ora por diante
vai ser ah-oh-ah o de Zé Bebelo Vaz
Ramiro! Como
confiança só tenho em vocês, companheiros,
meus amigos: zé-bebelos! A vez chegou: vamos
em guerra. Vamos,
vamos, rebentar com aquela cambada de patifes!...” (ROSA, 1982, p.74).
Para
encarnar o cenário sexuado do sertão, outras lógicas discursivas ainda
são produtivas. Descolam-se natureza e identidade social com um
investimento em imagens, cujo implícito dos corpos se esconde atrás de
movimentos masculinos ou femininos: “Órfão de conhecença e de papéis
legais, é o que a gente vê mais, nestes sertões. Homem viaja,
arrancha, passa: muda de lugar e de mulher [...]” (ROSA, 1982, p.35).
Nesse
sentido, pintam-se cenas em que os movimentos do corpo não são feitos
da matéria do sexo, da natureza; encenam-se corpos movidos a gestos
ensaiados na representação da vida social: “Ele pitava era charutos.
Mais me disse: - ‘Sei senhor homem valente, muito valente... Eu
precisar de homem valente assim, viajar meu, quinze dias, sertão agora
aqui muito atrapalhado, gente braba, tudo...’” (ROSA, 1982, p.57).
As figuras do
masculino são desenhadas nos atos bélicos, em uma lógica de dureza
disciplinar: “E chefe será. Baixamos nossas armas, esperamos vossas
ordens” (ROSA, 1982, p.71). Seus movimentos são guiados pela
racionalidade do homem que planeja e pensa antes de executar: “Zé
Bebelo simplificava os olhos, e perguntando e ouvindo avante. Às vezes
riscava com ponta duma vara no chão, tudo representado. Ia organizando
aquilo na cabeça” (ROSA, 1982, p.73). A voz de comando reveste a
firmeza da coragem irrestrita: “[...] no
tiroteio de
inteira noite, Andalécio comandava e esbarrava, para gritar feroz: -
‘Sai pra fora cão! Vem ver! Bigode de homem não se corta!” (ROSA,
1982, p.129).
Os atos de
vigor e coragem são associados ao masculino na figura de um pai que
interdita aparências de movimentos associados à feminilidade: “Carece
de ter coragem [...] Meu pai disse que não se deve ter [...] Meu pai é
o homem mais valente deste mundo [...] Ah, tu: tem medo não nenhum?”
(ROSA, 1982, p.83).
O homem
sertanejo mostra na secura e velocidade dos gestos as representações
de sua masculinidade: “eu, com minhas armas, matadeiras, tinha dado
revolta contra meu padrinho, saíra de casa, aos gritos, danado no
animal, pelo cerrado afora, capaz de capaz! (ROSA, 1982, p.96).
A estética
da macheza compõe-se ainda na referência simbólica ao figurino da
indumentária bélica: “Por via de sua macheza. Ah, Zé Bebelo era o do
duro – sete punhais de sete aços, trouxados numa bainha só!” (ROSA,
1982, p.101).
Ainda a
voz narrativa busca, em seu processo de identificação, os signos da
masculinidade nos seus modos de ser, de agir e de contar a própria
história:
Mas, aí, eu fiquei inteiriço. Com a dureza de querer, que espremi de
minha sustância vexada, fui sendo outro, eu mesmo senti: eu Riobaldo,
jagunço, homem de matar e morrer com a minha valentia. Riobaldo,
homem, eu, sem pai, sem mãe, sem apego nenhum, sem pertencências.
Pesei o pé no chão, acheguei meus dentes. Eu estava fechado, fechado
na idéia, fechado no couro.
(ROSA, 1982, p.155).
Nesta descrição,
Riobaldo
representa a macheza
como um tornar-se, deslocado de um fundamento natural, materializado
no comportamento, no portar-se do corpo que transforma uma
subjetividade em masculinidade.
Já os
corpos femininos, certas vezes aparecem como um só, em uma identidade
comum, compondo forma única bem definida:
Nas folgas vagas, eu ia com os companheiros, obra
de légua dali, no Leva, aonde estavam arranchadas as mulheres, mais de
cinqüenta. Elas vinham vindo, tantas, que, quase todo dia, mais tinham
de baratear [...] Onde é que já se viu homem valer, se não tem à mão
estadas raparigas. (ROSA, 1982, p.102).
Aparecem, muitas vezes, como efeito de uma
narrativa de homem, incorporando as expectativas do olho masculino:
“[...] mulher casada, filha do Malinácio. E ela era bonita, sacudida.
Mulher assim de ser: que nem braçada de cana – da bica para os cochos,
dos cochos para os tachos” (ROSA, 1982, p.110).
O corpo da
mulher, no ato sexual, entrega-se numa passividade amedrontada,
subordina-se imóvel como cenário, ornamento, receptáculo do sêmen, em
obediência cega:
Ao cabo que pude, a moça – fechado os olhos – não
bulia [...]. A moreninha miúda essa se sujeitou fria estendida, para
mim ficou de pedras e terra. Ah, era que nem eu nos medonhos fosse –
e, o senhor crê? – a mocinha me agüentava era num rezar, tempos além.
(ROSA, 1982, p.133).
O corpo
feminino, ainda, é cantado em tom de romance, que o afasta do desejo
carnal, associando-o a um amor purificado, na sua busca por uma união
espiritual:
Coração cresce de todo lado [...] Coração mistura
amores. Tudo cabe. Conforme contei ao senhor, quando Otacília comecei
a conhecer [...] só vislumbrei graça de carinha e riso e boca, e os
compridos cabelos, num enquadrado de janela, por o mal aceso de uma
lamparina (ROSA, 1982, p.145).
A partir
dessas cenas, nessas diversas figurações de corpos de homem e de
mulher, desenham-se limites corporais que agrupam dentro de um espaço
cercado, de forma rigidamente associada, dados da natureza, da
anatomia corporal, do desempenho de papéis sociais e das formas de
subjetivação. Essas fronteiras constituem o mecanismo de
inteligibilidade da percepção, que reconhece nessas figuras formas
familiares.
Na sobreposição de
imagens de corpos, atos, e desejos, vai se formando uma figura que
remenda o corpo sexuado, como um dado da natureza, à identidade
sexual, como construção cultural e ao desejo sexual, como resultado
deste movimento. Nesta figura, articula-se um jogo discursivo operado
a partir de um centro fixo paradigmático, dentro da chave
corpo-sexo-papel social-desejo. Este jogo estruturalista
limita os corpos que circulam nessas cenas a movimentos previsíveis e
perfeitamente inteligíveis na esfera da percepção do narrador, não lhe
causando qualquer estranheza. São corpos que se fecham dentro de
fronteiras imaginárias, não operando na narrativa qualquer efeito de
travessia, mas que precisam ser confessados, porque se não são a carne
em si mesmos, a revelação do desejo em si, compõem o cenário contra o
qual o desejo se projeta e ganha nitidez.
PARA ALÉM DA MATRIZ CONFESSIONAL
Segundo Judith Butler,
teórica reiteradamente citada pelo discurso queer,
a discussão sobre o corpo em sua construção histórico-cultural deve
ser pensada como processo constitutivo de uma materialidade que se dá
a perceber como natural. Tal processo se expressaria num discurso de
sexualidade a diferenciar, demarcar e, finalmente, produzir os corpos
que governa, mediante um sistema de normas constantemente reiteradas (BUTLER,
1993, p. xi).
Dentre os mecanismos
de reiteração do sistema, a performatividade
do gênero, constitutiva da materialidade dos corpos, materializa o
sexo do corpo, demarcando a diferença sexual, a serviço da
consolidação do imperativo heterossexual. O sexo masculino/feminino,
nessa perspectiva, não é simplesmente o que se tem ou uma descrição
estática do que se é, ele constitui uma das normas sob as quais o
indivíduo se torna viável, a qualificar um corpo para a vida inteira
dentro do domínio de uma inteligibilidade cultural (BUTLER, 1993, p.
2).
A partir desse tipo
de formulação, os estudos gays e lésbicos se deslocam do campo da
teoria dos gêneros a constituir uma teoria própria, que passou a ser
chamada pela academia norte-americana, nos anos 90, de teoria queer.
Partindo do princípio
de que a identidade sexual, a orientação sexual e inclusive a
sexualidade biológica, somente encontram possibilidade de rígida
articulação pelo artifício discursivo, a teoria queer
problematiza e desconstrói as figurações da identidade construídas a
partir dos conceitos de “natural” e “normal”. Ao investigar este
sujeito queer, a teoria rearticula os estudos identitários
anteriores, especialmente aqueles sobre o gênero feminino, a fim de
congregar toda uma comunidade à qual, por diversas razões, não se
aplique a identidade heterossexual cultural e historicamente
construída.
Um sexo,
pois, não existe a não ser no âmbito de uma injunção social que, ao
construir a materialidade dos corpos, naturaliza a idéia de que um
determinado sexo faça supor um determinado gênero, que faça supor um
determinado desejo. É dentro desta rígida articulação que opera o
contrato heterossexual, visto que o desejo “normal” é sempre o desejo
pelo sexo narrado como oposto.
O discurso sobre os
corpos, que se instaura a partir dos estudos queer, desconstrói
ainda as narrativas do corpo, revelando-o como discursivamente
constituído. Tais narrativas, revelam-se mitoformes,
na medida em que tecidas a partir de um mito de origem, cuja cena de
fundação já foi repetidamente representada através da história: no
imaginário helênico, pela encenação dos seres pré-históricos
assexuados, divididos em dois sexuados dotados de sexos opostos e
complementares, cujos destinos se orientariam no sentido da busca da
metade originalmente perdida (PLATÃO, 1979, p.23); no imaginário
cristão, a cena de invenção do homem e, então, da mulher, como fruto
de sua costela, e complemento harmônico ao projeto divino da criação
(Bíblia, Gn 2, 18); no imaginário científico, a partir da descoberta
da presença ou ausência do falo, a definir o destino psíquico-social
dos corpos (FREUD, 1976, p.309).
A partir dessas cenas
míticas é que são historicamente construídos os corpos em torno de um
único dado físico: o sexo. Desenham-se, pois, como projetos de
fronteiras, no limite das quais se devem reger os comportamentos
humanos, sob o signo de uma complementaridade imaginária, que toma
como paradigma de legitimação um dado isolado da sexualidade, a
reprodução. Desde sempre problematizada como mecanismo fundamental de
subsistência da espécie humana, e regulamentada a partir dos
interesses da polis, a reprodução é trazida para o centro fixo
de um sistema discursivo de sexualidade, ditando-lhe as regras de um
jogo estruturalista, cuja rigidez afasta para a periferia uma
multiplicidade de outras narrativas do mesmo tema.
A
narrativa central dos corpos, a partir de uma lógica
heterofalocêntrica, define os indivíduos como sujeitos de um gênero
masculino ou feminino, estabelecendo uma relação fixa de continuidade
entre sexo, gênero e desejo e marcando seus corpos como normais ou
abjetos. Tal taxonomia se dá, portanto, na articulação de movimentos
sócio-históricos datados, que se encontram tramados em redes
discursivas de um poder que materializa a classificação social e a
auto-identificação dos indivíduos a partir de seus corpos,
mitologicamente narrados como pré-culturais.
Tal matriz
discursiva da sexualidade, a partir da qual os sujeitos “normais” se
constituem, requer a produção simultânea e marginal de um domínio de
seres “anormais”, que circulam nas zonas do inabitável, a definir a
zona limítrofe do sujeito culturalmente enquadrado. Nesse sentido, o
sujeito, a partir de seus processos de identificação sexual, é
constituído por uma força de exclusão, que produz um campo exterior
ainda constitutivo deste mesmo sujeito; ou seja, um exterior abjeto
que é interior ao sujeito como origem de seu próprio repúdio fundador
(BUTLER, 1993, p. 3).
Pode-se
compreender, portanto, este resultado ambivalente como resultante de
um processo de subjetivação que, pelo artifício do discurso cultural,
dá a perceber, como naturalmente excludente, aquilo que é produto de
uma metodologia cultural taxológica. São construídos
corpos/gêneros/sexualidades como centros paradigmáticos fixos, para um
dos quais deve convergir a formatação dos sujeitos sexuados. O que
está fora dessa metodologia que orienta a percepção cultural dos
indivíduos, movimenta-se no campo do ininteligível, como formas de
contornos imperceptíveis, numa ausência de estética reconhecível.
O corpo inconfessável
do grande sertão
Na busca
da narrativa pelo corpo como via de compreensão da experiência, de
percepção do real, o corpo que se deseja é um corpo que sempre foge e
não permite uma apreensão totalizadora. É um corpo distendido na
narrativa, que não tem forma sólida, seu fulcro fragmentador é o
personagem Diadorim. A voz de enunciação diz: “Diadorim é minha
neblina” (ROSA, 1982, p.22).
Circulando entre
essas imagens, pulsando dentro e fora desses círculos ressonantes,
dança o diabo na rua, no meio do redemunho. De olhos verdes,
Diadorim se apresenta em estilhaços fulgurantes, informe.
Instala-se o
personagem na narrativa como uma dança insinuada que vai revelando
ausência, mãos, braços, olhos… O nome é a primeira parte do corpo que
se mostra: “Conforme pensei em Diadorim. Só pensava era nele” (ROSA,
1982, p.19).
Diá,
sema em que se lê a noção de diabo, impulso caótico que fervilha em um
ser, semanticamente oposto à relação com dea, sema em que está
contida a noção de divindade (MACHADO, 1976, p. 66). Dor,
intermédio, vereda, travessia sofrida para Im, que embora
funcione como prefixo de negação, aqui se resignifica como sufixo
neutro, sem marcação de gênero, compósito de opostos.
Diadorim
é o nome que primeiro aparece na narrativa para designar o amigo do
narrador-personagem Riobaldo, nome presente no seu pensamento e na sua
fala. Reinaldo é o nome que veste o jagunço como pulsão bélica
de morte, num corpo que se apresenta vivo e masculino. Maria
Deodorina da Fé Bettancourt Marins, nome da revelação final, como
pulsão de vida do batistério, nome de um corpo feminino e morto.
Na contramão de uma
intervenção crítica que articula essa pluralidade de nomes do
personagem – na ordem supra apresentada – à hierarquia platônica de
Idéia, cópia e simulacro (HANSEN, 2000, p.130), pode-se ler o
significante Diadorim como potência de um simulacro, não mais
platônico, um simulacro deleuziano.
Em sua
leitura crítica do personagem Diadorim como uma alegorização do
ambíguo, Hansen articula suas três designações aos três níveis
platônicos de categorização do mundo. O nome de batismo, irrevelado a
todos, estaria no nível da essência invisível, a Idéia; o nome do
jagunço, que faz o personagem parecer homem, ocultando o nome real,
estaria no nível da aparência fingida, a imagem, a cópia; finalmente,
o nome Diadorim, ocultação, segredo e mentira, mas também revelação,
seria mimese de mimese, fantasma, simulacro.
Parece,
entretanto, nesta articulação platônica, que o personagem encarnado na
força do nome Diadorim, perde sua potência de elemento desestruturante
das percepções fixas da narrativa, ao mesmo passo que sistematizante
de uma cosmologia transgressora.
Nesse
sentido, analisa-se o conjunto de aparições e efeitos
narrativo-discursivos do personagem a partir da noção deleuziana de
simulacro que, ao contrário de afirmar uma lógica dicotômica
aparência/essência, lê na pluralidade de nomes do personagem um
sentido reversor, que desestrutura a sua constância, que a fratura e
expõe a carne viva da sua motivação seletiva e hierarquizante.
O nome de batismo,
Maria Deodorina da Fé Bettancourt Marins, alegoria da Idéia, ser,
essência, que só se dá a revelar com a morte, batiza um corpo feminino
e novo para Riobaldo. Associa-se à visão de um corpo total, que lhe
estava oculto e que se lhe revela morto. Corpo feminino infértil,
origem de vida e paralisado pela morte, a Idéia platônica, absoluta,
essencial, paralisada, configura-se, então, como uma impossibilidade.
Que Diadorim era o corpo de uma mulher, moça
perfeita... Estarreci. A dor não pode mais do que a surpresa. A coice
d’arma de coronha... Ela era. Tal que assim se desencantava, num
encanto tão terrível [...] Eu estendi as mãos para tocar naquele
corpo, e estremeci, retirando as mãos para trás, incendiável: abaixei
meus olhos (ROSA, 1882, p. 454).
Da
matriz de Itacambira, onde tem tantos mortos enterrados. Lá ela foi
levada à pia. Lá registrada assim. O senhor lê. De Maria Deodorina
da Fé Bettancourt Marins (ROSA, 1882, p. 458).
Reinaldo,
o nome do jagunço, alegoria da imitação, pode não reproduzir a forma
da Idéia (feminina), mas repete e continua o seu princípio ativo de
relação estreita entre vida e morte, se formata na pulsão da morte que
norteia a vida da jagunçagem.
O Reinaldo. Diadorim, digo. Eh, esse sabia ser
homem terrível. Suspa! O senhor viu onça: boca de lado e lado,
raivável pelos filhos? Viu rusgo de touro no alto campo, brabejando;
cobra jararacussu emendando sete botes estalados; bando doido de
queixadas se passantes, dando febre no mato? E o senhor não viu o
Reinaldo guerrear!...” (ROSA, 1982, p.123).
Diadorim é o nome desarticulador da percepção de
Riobaldo, não como mimese da mimese, mas antes como conjunção das
forças do masculino e do feminino, da vida e da morte, de deus e do
diabo, a revelar os outros corpos como centros de continuidade e
semelhança, centros falseados pela percepção, centros de limite,
centros esterilizados, centros de morte. Diadorim é o nome que
sobrevive na narrativa de Riobaldo: “Pois
então: o meu nome, verdadeiro, é Diadorim... Guarda este meu
segredo. Sempre, quando sozinhos a gente estiver, é de Diadorim que
você deve me chamar, digo e peço Riobaldo...” (ROSA, 1982, p.121).
Diadorim é
o significante que diz a verdade do personagem em sua polivalência
semântica. É o signo cuja complexidade só Riobaldo pode apreender em
seu apelo singular.
Assim eu ouvi, era tão singular. Muito fiquei repetindo em minha mente
as palavras, modo de me acostumar com aquilo. E ele me deu a mão.
Daquela mão, eu recebia certezas. Dos olhos, os olhos que ele punha em
mim, tão externos, quase tristes de grandeza. Deu alma em cara.
Adivinhei o que nós dois queríamos – logo eu disse: - ‘Diadorim...
Diadorim!’ – com uma força de afeição. Ele sério sorriu. E eu
gostava dele, gostava, gostava. (ROSA, 1982, p.121).
Diadorim é um nome
único. Causa efeito de estranheza à percepção de Riobaldo que, para o
tornar inteligível, necessita de uma forma familiar, corpórea, que
dialogue com sua memória afetiva. A mão, os olhos de Diadorim, todos
signos familiares da afetividade que os liga, constituem via de acesso
à incorporação do estranho nome pelo discurso do narrador que, a
partir de então, percebe-o pronunciável: “Diadorim... Diadorim!”.
O
simulacro platônico, que a força deste personagem reverte na
cosmologia narrativa, constitui fantasma – falso pretendente, posto
que em muito afastado da Idéia – que dá essência ao verdadeiro
pretendente no mundo da representação legítima. Nesse sentido, o
simulacro se constrói a partir do desvio do mundo das Idéias, de sua
subversão. Por sua dessemelhança, o fantasma se configura como falso
pretendente e deve ser recalcado, submerso, em função da emergência da
verdadeira cópia, que reproduz uma certa essência original (DELEUZE,
1974, p. 262).
Contudo,
apesar de não guardar coerência com a existência essencial, o
simulacro mantém uma existência estética que, por ardil, visa gerar
uma impressão de semelhança no observador, trazendo-o para dentro de
sua lógica:
O simulacro inclui em si o ponto de vista
diferencial; o observador faz parte do próprio simulacro, que se
transforma e se deforma com seu ponto de vista. Em suma, há no
simulacro um devir-louco [...] um devir sempre outro, um devir
subversivo das profundidades, hábil a esquivar o igual, o limite, o
Mesmo, ou o Semelhante: sempre mais e menos ao mesmo tempo, mas nunca
igual. (DELEUZE, 1974, p. 264).
Encenando
seu efeito estético, Diadorim, este simulacro, emerge da profundidade
de onde estaria recalcado para gerar no seu observador, Riobaldo, uma
multiplicidade diversa de sensações, dentre as quais, aquela que o
absorve para a identificação através da memória do desejo materno,
quando as coisas não tinham formas tão definidas em seus limites
culturais e os horizontes sígnicos eram mais amplos: “os
afetos. Doçura do olhar dele me transformou para os olhos da velhice
de minha mãe. Então, eu vi as cores do mundo. Como no tempo em que
tudo era falante, ai, sei.” (ROSA, 1982, p. 115).
Diadorim movimenta-se na narrativa entre corpos
que operam nos limites de uma matriz discursiva da sexualidade:
jagunços, prostitutas e mulheres casadas, em suas figuras sexuadas;
crianças, padres e moças virgens, como figuras assexuadas. Todos,
produzindo-se a partir de tal matriz, circulam na zona cognitiva do
habitável, do reconhecível pela voz da narrativa. Já Diadorim, em seus
movimentos limítrofes, oscila entre o domínio de seres normais e
anormais, circulando entre a normalidade e a marginalidade.
O
personagem-fenômeno compõe, em uma única figura, um sujeito em sua
identificação sexual e seu exterior, excluído de si pelo processo de
subjetivação. Riobaldo, ao se relacionar com essa possibilidade
impensável, por um efeito de identificação com a figura em que vê a
completude que lhe falta, deseja esse seu exterior abjeto, que
descobre interior a si, na origem da formação de seu repúdio fundador.
A vai, coração meu foi forte. Sofismei: se
Diadorim segurasse em mim com os olhos, me declarasse as todas as
palavras? Reajo que repelia. Eu? Asco! Diadorim parava normal,
estacado, observando tudo sem importância. Nem provia segredo. E eu
tive decepção de logro, por conta desse sensato silêncio? [...] Resumo
que nós dois, sob num tempo, demos pra trás, discordes. Diadorim
desconversou, e se sumiu por lá, por aí, consoante a esquisitice dele,
de sempre às vezes desaparecer e tornar a aparecer, sem menos. Ah,
quem faz isso não é por ser e se saber pessoa culpada? (ROSA, 1982, p.
50)
O corpo de
Diadorim, estilhaçado em fragmentos que vão aparecendo ao leitor de
forma impressionista, não pode ser tocado, por não constituir um lugar
ontológico fixo. Configura um espaço ambivalente de desejo e de
culpabilização, de prazer e de negação: “e em mim a vontade de chegar
todo próximo, quase uma ânsia de sentir o cheiro do corpo dele, dos
braços, que às vezes adivinhei insensatamente – tentação dessa eu
espairecia, aí rijo comigo renegava”. (ROSA, 1982, p. 114)
A figuração de
Diadorim na estrutura da narrativa gera, na percepção de Riobaldo, na
qual se superpõem outras imagens de corpos sexualizados, um efeito de
caos que, segundo DELEUZE (1974, p.266), é o caráter essencial da obra
de arte moderna, em uma linhagem que remonta a James Joyce, em
Finnegans’s Wake (CRUZ, 2003, p.74-75). O descentramento
operado pelos movimentos de Diadorim tem potência para afirmar todos
os corpos sexualizados, produzidos pela mesma matriz discursiva,
normais ou abjetos, gerando uma suspensão do limite e uma
heteroglossia que embaça o olhar da narrativa e polissemiza a voz do
narrador.
Mas os olhos verdes sendo os de Diadorim. Meu
amor de prata e meu amor de ouro. De doer, minhas vistas bestavam, se
embaçavam de renúvem, e não achei acabar para olhar para o céu. (ROSA,
1982, p. 42).
Em se
analisando a discursividade da narrativa, Diadorim pode ser pensado
como o signo ideológico de Volochínov, conceituado por Stuart Hall,
dentro do qual se combinam diferentes índices de valor, em uma
plurivalência que permite a reversibilidade da lógica do discurso
ideológico (HALL, 2003, p. 231).
Diadorim é
um espaço discursivo de ruptura, de pós-identidade sexual, não
reconhecível como familiar. Por operar na suspensão do limite entre o
normal e o abjeto, constitui um corpo discursivo transgressor,
metáfora de transformação, que instaura o estranhamento na percepção
do narrador como móvel da travessia.
Últimas cartas
Atualmente, o corpo é como um signo discursivo a partir do qual se
pensa a experiência, um corpo metáfora, via de interpretação do real,
suficientemente potente para a apreensão/reapreensão do espaço de
representações culturais.
A partir dessa
compreensão do lugar contemporâneo do corpo, esta palavra
(meta)crítica se orienta, capturando as imagens corpóreas que circulam
na narrativa roseana como metáforas fixas, estruturalmente articuladas
à dimensão do natural, do social ou a ambos. São figuras que refletem
a estética de discursos biológico-psicanalíticos, que construíram o
imaginário dos corpos sexuados entre os séculos XVIII e XX,
imagens que não operam qualquer efeito transformador na voz narrativa,
assim como não instituem qualquer ruptura na rede discursiva do
pensamento ocidental. Ao contrário, constroem o imaginário narrativo e
discursivo sobre o qual se fundam o corpo e a sexualidade nesta banda
forjada do globo.
Diadorim, topos
hermenêutico de desconstrução, é ativado como força pós-moderna de
supressão de fronteiras discursivas, espaço heterotópico que amplia a
percepção do signo corpóreo e revitaliza a sua potência política de
resistência e liberdade.
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