Edições anteriores

 

 

 

 

Como citar esse artigo

 

Baixar o arquivo ou imprimir

 

Inacusatividade e ergatividade  na fala rural do PB

 

                                                                                            Guilhermina Mendes de Carvalho

 Mestre em Letras – PPGLL / UFBA

guilherminamaria@uol.com.br

 

 

Resumo

Este estudo caracteriza o verbo inacusativo e o ergativo a partir de um levantamento dos verbos desse tipo encontrados na fala de um informante – Inquérito nº 06 – da comunidade de Cinzento, Bahia, focalizando três itens relevantes para a compreensão da gramática do  português brasileiro: o emprego da  ordem SV e VS na sentença,  o preenchimento da posição de sujeito versus sujeito nulo e a concordância verbo-sujeito no plural.

Palavras-chave: inacusatividade; ergatividade; verbo intransitivo; verbo transitivo; argumento interno; argumento externo.

 

 

1 Introdução

 

Objetivando chamar a atenção para a importância de um fenômeno lingüístico, em face das implicações dele decorrentes nos usos lingüísticos dos falantes, em particular, dos falantes do português brasileiro, PB  (questões como ordem de palavras e concordância sujeito-verbo, entre outras, que tornam peculiar a fala do brasileiro), faço, inicialmente, um breve estudo, no âmbito da Teoria Gerativa, a respeito desse fenômeno mais amplo, conhecido como inacusatividade, para, em seguida, deter-me sobre duas classes de verbos que ostentam as propriedades características da inacusatividade: os verbos inacusativos propriamente ditos e os verbos ergativos. Neste estudo, analiso as ocorrências de verbos inacusativos e ergativos nos dados coletados em inquérito realizado  com um informante semi-alfabetizado da zona rural, de uma comunidade de afro-descendentes, denominada Cinzento, na região da Bahia.

Com efeito, entre os lingüistas, tem se destacado o interesse  por certas construções reveladoras de um fenômeno que afeta muitas línguas, hoje consensualmente conhecido como “inacusatividade”. A constatação desse fenômeno impõe uma revisão na classificação tradicional  dos verbos plenos[1], que se dividem em dois tipos básicos: transitivos e intransitivos.

Adotando um critério notadamente semântico, é possível distinguir um verbo transitivo de um intransitivo pelo número e tipo de argumentos que cada um seleciona. Um verbo transitivo possui dois argumentos nucleares[2], um deles exerce a função temática de Tema, enquanto o outro é tipicamente um Agente, como em (1). Já o verbo intransitivo possui um único argumento nuclear, tipicamente um Agente, como em (2). Numa abordagem de cunho sintático, pode-se dizer simplesmente que o verbo transitivo é o que subcategoriza um argumento interno, além do argumento externo.

 

 

(1) JoãoAGENTE comprou um carroTEMA.

(2) MariaAGENTE trabalha.

 

Em (1), João, com a função temática de Agente, é o argumento externo, e um carro, com a função temática de Tema, o argumento interno do verbo transitivo comprar. Em (2), Maria, com a função temática de Agente, é o argumento externo do verbo intransitivo trabalhar e seu único argumento. Desse modo,  o argumento interno com a função de Tema  é um dos elementos identificadores da classe dos verbos transitivos.

Ora, entre os chamados “intransitivos”, observou-se a existência de verbos que, por possuírem um único argumento com a relação temática de Tema, não se enquadram nessa classe, tampouco na dos transitivos: são os verbos inacusativos.

 

(3) A criançaTEMA caiu.

(4) O rapaz TEMA chegou.

 

Assim, em (3) e (4),  os argumentos únicos dos verbos inacusativos cair e chegar, respectivamente, a criança e o rapaz,, exercem a função temática de Tema, não têm caráter agentivo em relação ao evento expresso pelo verbo porque, na verdade, como veremos adiante, são seus argumentos internos que se projetaram para a posição de sujeito.

 

 

1.1 Inacusatividade lexical e inacusatividade estrutural

 

Participando do fenômeno da inacusatividade, é possível identificar, de um lado, os verbos inacusativos  - inacusatividade lexical - e, de outro, as chamadas “construções inacusativas” - inacusatividade estrutural - assim chamadas por apresentarem as propriedades básicas identificadoras desse fenômeno, quais sejam: o verbo não atribui caso acusativo a seu argumento interno, nem papel temático à posição de sujeito. Assim é que as construções passivas, copulativas e médias compõem, juntamente com os  verbos inacusativos,  o que Duarte (2003, p. 507) chama de “a família das construções inacusativas”.

Na representação sintática inicial de uma construção inacusativa, o argumento interno do verbo inacusativo ocupa a posição  de  complemento  do  verbo  (os garotos,  em  (5 a)), da mesma forma que o argumento interno de um verbo transitivo (o filme, em (5 b)). Mas, como o  verbo inacusativo não seleciona argumento externo, a posição de especificador do sintagma verbal, Spec, VP, está vazia (em (5 a)) e, na construção transitiva, preenchida pelo argumento externo os garotos (em (5 b)); o argumento interno do verbo inacusativo não recebe caso do verbo (compare-se (5 a) com (5 b)).

        

(5) a. Os garotos chegaram.

b. Os garotos viram o filme.

 

 

1.2 Construções inacusativas pessoais e impessoais

 

Nas línguas de sujeito nulo[3], como é o caso do português, as construções inacusativas podem ser de dois tipos: pessoais e impessoais.

 

(6) a. Os garotos chegaram.

b. Chegaram os garotos.

 

As construções inacusativas pessoais, como em (6 a), resultam do movimento do argumento interno do verbo, expresso por um DP[4], (os garotos), para a posição de especificador do sintagma flexional, Spec, IP, para receber caso nominativo[5]. A obrigatoriedade de marcação de caso nesse DP realizado foneticamente decorre do Filtro do Caso[6] e explica o movimento desse DP, da posição de objeto direto do verbo, onde não recebeu caso acusativo do verbo inacusativo (daí essa denominação), para a posição de sujeito, onde recebe caso nominativo da flexão verbal. Esclareça-se, ainda, que essa posição é não-temática, pois a posição de sujeito definida em (7 a), marcada com e (do inglês empty, vazia), que não corresponde a nenhum argumento do verbo, só é requerida por uma exigência do Princípio da Projeção Estendida, segundo o qual toda sentença deve ter sujeito. Assim, também não há violação ao Critério Temático, segundo o qual cada argumento do verbo deve receber um só papel temático. Esse argumento interno alçado à posição de sujeito, é interpretado como tópico[7], de acordo com Duarte (2003, p. 512).

 

(7) a. [IP e [I’[VP V DP]]]

      b. [IP DPi [I’ [VP V ti ]]]

 

As construções inacusativas impessoais (6 b) têm o argumento interno direto na posição pós-verbal, sendo interpretado como foco informacional[8], segundo Duarte (2003,  p. 512), cujo estudo se detém sobre o português europeu (PE). Como esse argumento interno não recebe caso acusativo do verbo (daí o nome de inacusativo dado ao verbo), diferentes propostas explicativas de atribuição de caso ao argumento interno pós-verbal nesse tipo de construção inacusativa têm sido apresentadas na literatura gerativa[9].

Enquanto na fala coloquial do PE só se observa ausência de concordância verbal nas construções inacusativas impessoais (conforme Duarte, 2003, p. 513), na fala coloquial do PB,  as construções inacusativas pessoais e impessoais, cujo contexto de uso pode diferir daquele das construções desse gênero no PE[10], alternam a concordância, como em (8 ) e (9) b) embora, ao que parece, a preferência seja pelas construções sem concordância (conforme  (8), segundo admite Figueiredo Silva (1996, p. 100), entre outros. Um dos objetivos desta pesquisa é justamente observar os casos de concordância do verbo com o sujeito no plural, analisando os contextos em que ocorrem e possíveis fatores intervenientes, apesar de achar que não vai haver muitas ocorrências.

 

                 (8) Chegou os livros  que eu pedi.

                 (9) Chegaram os livros que eu pedi. 

 

1.3 Inacusatividade e  ergatividade

 

1.3.1 Verbos inacusativos - subclasses      

 

Os verbos inacusativos dividem-se nas seguintes subclasses: a) verbos que denotam eventos com uma causa interna; b) verbos de movimento que exprimem uma direção inerente; e c) verbos de existência e de aparição (DUARTE, 2003).

Entre os verbos inacusativos que denotam eventos com uma causa interna, encontram-se verbos não-agentivos: que exprimem uma reação física ou psíquica (corar, empalidecer, desmaiar); de emissão perceptível através dos sentidos (explodir, flamejar); de mudança de estado devida a uma causa interna (crescer, nascer, florescer).

De acordo com Levin e Hovav (1999, p. 94), esses verbos exercem fortes restrições semânticas sobre seu argumento único, como é o caso dos verbos de emissão, por exemplo, com os quais somente um número limitado de objetos podem se qualificar como seus argumentos. Assim, podemos dizer que somente certos artefatos explodem, ou também, de referência aos verbos de mudança de estado devida a causa interna, que somente certas plantas florescem, etc.

Quanto aos verbos inacusativos de movimento, para Duarte (2003, p. 520), são aqueles verbos de movimento que denotam direção  inerente[11]  (ir/vir, entrar/sair, chegar/partir). São também inacusativos, os verbos de movimento que expressam mudança de posição, como deitar(se), levantar(se).

 Já entre os verbos de existência, encontram-se: os existenciais (existir, constar, haver, ter (existencial), os existenciais locativos (morar, residir, viver) e os que indicam carência (faltar, escassear) . Entre os verbos de aparição, há os que expressam a entrada em cena e a  saída de cena de uma entidade (aparecer, brotar, surgir, desaparecer, sumir) e ainda os que denotam a ocorrência de um evento (levar (=passar(se)), acontecer, ocorrer, passar(se).

 

1.3.2 Verbos ergativos

 

Participando do fenômeno da inacusatividade, os verbos ergativos, por sua vez, são verbos transitivos que têm a propriedade de poder apresentar uma variante intransitiva/ergativa, em que o argumento interno (o objeto direto interno (o objeto direto o vaso em (10 a)) é alçado à posição de sujeito, conservando a mesma relação temática com o verbo, isto é, a função semântica de Tema, e o argumento externo (sujeito/agente Maria) não é exteriorizado (conforme (10 b).  Esses verbos são, por conta disso, também chamados de verbos transitivo/causativos ou verbos de alternância causativa[12]. Exemplo:

 

(10) a. Mariai quebrou o vasoj.

b. O vasoj quebrou.

                                                      

A variante intransitiva de certos verbos ergativos apresenta uma marca morfológica sob a forma de um clítico pseudo-reflexivo, com propriedades distintas dos verdadeiros reflexivos. No PE, essa marca morfológica ora é obrigatória com certos verbos, como rasgar-se, ora é possível, mas não obrigatória, como em queimar(se), ora, ainda, não é admitida, como é o caso de acabar e aumentar. No  PB, o emprego desse clítico não-reflexivo parece ter caído em  desuso,  de modo que esta pesquisa pretende observar essa ocorrência e se há implicações resultantes desse desuso nessas construções.

 

Concluindo, após conceituar e caracterizar o fenômeno da inacusatividsade, separei os verbos inacusativos do grande grupo dos verbos intransitivos, chamando a atenção para a existência de outras construções que, apresentando as mesmas propriedades básicas dos verbos inacusativos, com eles compõem a chamada “família das construções inacusativas”. A seguir, salientei que as construções inacusativas podem ser pessoais ou impessoais, conforme se apresentem na ordem SV ou VS, o que implica diferenças na questão da concordância verbo-sujeito no PE e no PB. Por fim, apresentei os subtipos de verbos inacusativos e destaquei os verbos ergativos, também chamados de verbos de alternância causativa que, a seu modo, também participam do fenômeno da inacusatividade.

 

 

2 Verbos inacusativos e ergativos  na fala rural do PB

 

Nesta seção, procedo a  um levantamento - de acordo com a classificação aqui adotada (DUARTE, 2003) -  dos verbos inacusativos e ergativos encontrados na fala do informante (Inquérito nº 06, Cinzento-Bahia). A seguir, analiso os usos de certos verbos inacusativos e ergativos em função, principalmente, de três itens que considero relevantes para a compreensão da gramática do PB: a concordância verbo-sujeito no plural, a variação na ordem SV e VS e  a questão do preenchimento da posição de sujeito versus sujeito nulo.

 

2.1 Os verbos inacusativos

 

Neste item, vou estudar os verbos inacusativos encontrados na fala do informante, a partir de cada subgrupo apresentado no item 1.3.

 

2.1.1 Os verbos inacusativos  que denotam causa interna

 

No inquérito sob análise, encontrei os verbos (a)doecer, crescer, morrer, falecer, ir embora=morrer e vegetar, todos inseridos no subtipo dos verbos de mudança de estado devida a uma causa interna. Desses, o verbo morrer foi o mais usado (18 ocorrências), apresentando, um único caso com o sujeito no plural, permitindo observar a ausência de concordância de número entre o sujeito e o verbo (11a)[13]. Ainda sobre esse verbo, há 8 casos de sujeito nulo, pro, para 10 deles com a posição do sujeito preenchida por um DP ou um pronome na posição pré-verbal, evidenciando a ordem SV em todos eles, sem exceção (11 b), o que também se verificou com os outros verbos, nos casos em que a posição de sujeito foi preenchida - um com o verbo (a)doecer e dois com o verbo vegetar, como em (11 c). A exceção seria a construção com ir embora = morrer, em que o sujeito se encontra em posição pós-verbal (11 d), mas, nesse caso, ocorre uma leitura de lista[14], em que a posição pós-verbal é usual, reconhecida até pela gramática normativa, que se pauta no dialeto padrão. Finalmente, em contextos de duas ou mais orações com o mesmo sujeito referencial, normalmente, a posição de sujeito só é preenchida na primeira oração (como em (11e).

 

(11) a.  meus ti, no caso dos meus ti,  mudô e morreu. (CZ06- 20)

        b. Agora faleceu... meu pai morreu (CZ08-20)

        c. e eu adoeci. (CZ06-3)

        d. Já foi embora bisavô, avô, pai... (CZ06-3)

        e. Ele [o irmão] tinha uma barraca de confecções, andava nas fêra tudo e aí doeceu, num alimentava, num bebia, nem nada, é só pegô uma dor de cabeça braba até morrê...  (CZ06-14)

 

 

 

 

 

2.1.2 Verbos de movimento

 

No inquérito nº 06, encontrei os seguintes verbos inacusativos de movimento: cair, chegar, entrar, romper=sair, sair, ir, vir, voltar, descer, tropeçar. Desses, o de maior incidência de uso em todo o inquérito nº 06 é o verbo ir (55 casos), seguido do verbo vir (52 casos) e do verbo chegar, que ocupa a 3ª posição, com 24 ocorrências.

De acordo com Silva (2004, p. 516), esses verbos, como também os de aparição, selecionam um PP como complemento, que pode, ou não, ser expresso, como em  (12).

 

(12)

a. Ele foi pá São Paulo, ele tinha dezoito ano,... (CZ06-14)

b. Ele veio aqui, buscô meu irmão, ... (CZ06-14)

c. Porque a energia não inda chegô  a ... até o poço. (CZ06-5)

d. o dinhêro num ainda entrô.  (CZ06-9)

e. A gente pensa que tropeça e cai. (CZ06-1)

 

Quanto à variação na ordem de colocação SV e VS, citando apenas os verbos de maior incidência de uso, observei que o verbo ir, o de maior número de casos entre os verbos de movimento encontrados, apresentou, em todos eles, a ordem SV. O verbo vir  apresentou apenas 7 casos na ordem VS, das 41 ocorrências com a posição de sujeito preenchida. Tomando ainda como exemplo o verbo chegar, um verbo tipicamente inacusativo e o terceiro colocado entre os verbos de movimento encontrados, constatei que também com esse verbo a ordem SV é a majoritária, pois, em 16 ocorrências com a posição de sujeito preenchida, apenas 3 casos apresentam a ordem VS. Analisando esses três casos abaixo transcritos em (13), observei que, em todos eles, a posição de sujeito é ocupada por um DP lexical que introduz um referente no discurso, uma informação nova: em (13 a) e em (13 b), a seca (com o marcador de foco , em já chega a seca) e maio e junho; e em (13 c), a energia, que forma, com o verbo chegar, uma expressão subordinada que complementa o sentido de tarda a esperança, em tarda a esperança de chegar a energia. Esses elementos pós-verbais são o foco informacional dessas sentenças, o que é comum no PB em geral.

 

(13)

a. quato mês já chega a seca  (CZ06-13)

b. agora, quando chegá maio e junho (CZ06-13)

c. Porque tarda a esperança de chegá a energia (CZ06-2)

 

De referência ao preenchimento da posição de sujeito, há também variação quanto a sujeito preenchido versus sujeito nulo (conforme (14)): com o verbo chegar, são 16 casos com a posição de sujeito preenchida, para 8 casos de construções com sujeito nulo; com o verbo vir, houve 41 ocorrências com a posição de sujeito preenchida, para 11 casos de construções com sujeito nulo; com o verbo ir, de 41 construções com a posição de sujeito preenchida, ocorreram 14 com o sujeito nulo, pro. Finalmente, observei, também aqui, a freqüência de uso do sujeito preenchido apenas na primeira oração, nos casos de período com duas ou mais orações com o mesmo sujeito, independentemente do tipo do verbo, como em (15). Observe-se que, em (14 b), todavia, há uma repetição enfática do sujeito pronominal eu. Exemplos:

 

(14)

a. Aí cheguei assim com o sol quente suado (CZ06-9)

b. ce vê, eu chego aqui, eu tô sorrino, eu tô alegre  (CZ06-15)

(15)

a. eu fui onte, cheguei lá  (CZ06-9)

b. Tem vez qu’ela vinha de Pranalto, chegava lá, e o povo... (CZ06-19)

       

Por fim, quanto ao item concordância, somente em um caso houve registro de concordância sujeito-verbo no plural, na oração do período inicial de uma resposta ao inquiridor. No período seguinte, as orações não apresentam concordância. Nesse caso único de concordância, o falante responde ao inquiridor, repetindo a mesma forma verbal ouvida na pergunta (-Nunca vieram aqui?), o que pode explicar o emprego dessa forma verbal no plural pelo informante (16 d). Exemplos:

 

(16)

a. aonde eles vai é: ô seu Fulano, ô seu Beltrano (CZ06-21)

b. Daí pra cá os prefeito que entrô só fazia só reformá ele (CZ06-4)

c. nós saiu de lá dez e meia da noite  (CZ06-1)

d. Já vieram [os sobrinhos]. De primêro, eles vinha, mas depois que o pai   morreu vêi mais não.  (CZ06-15)

 

2.1.3 Verbos de existência e aparição

 

No inquérito nº 6, encontrei os seguintes verbos de existência e aparição: ter e ser existenciais (exemplos em 18a, 19 e 20), fazer impessoal, indicando tempo decorrido[15] (exemplo em (18b)); ir e ser (= ocorrer, acontecer), acontecer, passar, levar (exemplos em (18c) e (21 a,b)); morar, viver (exemplos em (17), (21c)  e (22).

Todos os verbos de existência e aparição supõem um constituinte locativo, participando da eventualidade que esses verbos expressam. Nas construções em que o locativo se encontra realizado, este pode estar posicionado antes  do  verbo,  geralmente   iniciando a oração, ou depois dele, em posição pós-verbal, como em (17):

 

(17)

a. Em Conquista ele morô base d’uns dez ano, por aí, ou mais. (CZ06-14)

b. ôtos mora na Lagoa d’Água (CZ06-21)

 

Neste inquérito, excetuando-se o verbo existencial locativo morar, que apresenta a ordem SV (conforme (17) acima) em todos os casos, a regra é a ordem VS com essa subclasse de verbos de existência e aparição (conforme (18),  encontrando-se apenas dois casos de sujeito pré-verbal, um com o verbo ser e outro com o verbo ter.

 

(18)

a. E ainda tem pedra quebrada até hoje aí. (CZ06-2)

b. agora fez um ano, ele vêi aí (CZ06-8)      

c. se acontecê algum erro, só vem pra cima de mim CZ06-15)                  

 

Quanto ao emprego de ter existencial,  observa-se que é muito produtivo no inquérito nº 06, totalizando 37 ocorrências, das quais somente uma (19) apresenta  a ordem SV, que ocorre numa construção de tópico, na qual o informante responde ao documentador, repetindo o elemento inseto, da pergunta ( - E...e num dá muito inseto?); logo após, o informante completa a informação, usando o sujeito em posição pós-verbal, numa construção em que se identifica uma leitura de lista, típica da ordem VS.

     

(19) Inseto tem, tem grilo e cascavel. (CZ06-18)

 

Sobre o emprego do verbo ser existencial, desusado na língua hoje, há uma ocorrência no inquérito que apresenta o sujeito em posição pré-verbal e acontece quando o informante comenta a respeito da criação da associação, comparando com o tempo de existência da comunidade de Cinzento.

                

(20)      aqui foi nove ano, nove...dez ano que inovô pá essa comunidade aqui começá com associação. A comunidade não, a comunidade tem cento e cinqüenta ano de abertura. Isso aí é desde os tempo de meus avô...bisavô, né? (CZ06-3)

 

Ainda a propósito desse emprego do verbo ser existencial, trata-se de construção corrente no português arcaico que, nos primeiros textos escritos conhecidos da língua portuguesa (século XIII), predominava sobre haver existencial (MATTOS E SILVA, 2000, p. 118), antes da emergência de ter com esse sentido. Fiz, então, a seguinte leitura:

 

Isso aí existe desde os tempos de meus avós... bisavós, né?

 

Nas construções com os verbos de existência, não há concordância sujeito-verbo no plural,  como se pode observar em (21) .

 

(21)

a. Já vai umas três ou quatro vez que eu passo pela tevê, né? CZ06-4)

b.  agora quando chegá mai e junho é as nebrina CZ06-13

c.  Minhas irmã mora uma lá, ôta no Pendanga. (CZ 06-15). 

 

Quanto ao preenchimento da posição de sujeito versus sujeito nulo, tomo para análise os existenciais locativos. Com o verbo morar, para um total de 31 ocorrências, em 27 delas a posição de sujeito se encontra preenchida (conforme exemplos em (17) e (21 c)); com o verbo viver, as 2 únicas ocorrências, uma com o verbo no gerúndio (em (22 a)), outra no infinitivo (em 22 b), não apresentam a posição de sujeito preenchida.

 

(22)

a. Que a pessoa só passa num camim, viveno cada parte d’uma vez só.

b. Agora  se o cabra chega, não faz...[.....], não faz onde vivê, ele pode ir pá onde fô, ninguém presta, ninguém vale nada, né? (CZ06-21)

 

Em resumo, após elencar as propriedades básicas dos verbos inacusativos propriamente ditos, apresentei sua classificação, para, em seguida, proceder a sua identificação no texto do inquérito em estudo, observando-os sob três aspectos: a ordem VS/SV, a questão do preenchimento da posição de sujeito versus o sujeito nulo e a da concordância verbo-sujeito. De referência ao primeiro, verifiquei a presença de variação na ordem de colocação sujeito-verbo na frase, com preferência mesmo pela ordem SV, à exceção dos verbos existenciais (aí não incluídos os existenciais locativos, cuja preferência é também pela ordem SV) e de aparição, entre os quais a ordem VS é a encontrada, na quase totalidade dos casos. Quanto ao segundo, registrei também variação, com preferência pelo preenchimento da posição de sujeito, observando que, nas construções de duas ou mais orações com o mesmo sujeito, parece haver preferência por preencher apenas a primeira posição. Finalmente, quanto ao terceiro, poderia afirmar que é absoluta a ausência de concordância nas construções de qualquer tipo com esses verbos, se não fosse a presença de um caso com o verbo vir (16 d) que, todavia, dadas as circunstâncias em que foi empregada a forma verbal no plural, entendo que possa ser considerado como irrelevante.[16] 

 

2.2 Os verbos ergativos

 

 

Considerando os usos  intransitivo/ergativos dos verbos transitivos de mudança de estado que expressam uma causa externa, isto é, uma eventualidade externamente causada, identifiquei, no inquérito sob análise, exemplos com os seguintes verbos: abrir, acidentar, afundar, amolecer, ampliar, assanhar, casar, celebrar, cortar, criar, derreter, desmantelar, desmontar, desviar, encher, escaldar, esconder, espalhar, esquentar, furar, imprensar, juntar, ligar, molhar, mudar, plantar, preocupar, resfriar, segurar, tirar.

Como já foi observado mais atrás, a variante intransitiva de certos verbos ergativos pode apresentar uma marca morfológica sob a forma de um clítico pseudo-reflexivo, com propriedades distintas dos verdadeiros reflexivos. Esse se ergativo parece estar ausente do uso do falante do PB urbano[17] e rural, como foi possível constatar em todos os casos encontrados no Inquérito nº 06, como em (26):

 

(26)

a. depois que ele chegô aqui ele casô  (CZ06-14)

b. quano chove é que cê vê eles, eles assanha, o buraco enche d’água. (CZ06-18)

c.   meus ti, no caso dos meus ti, mudô e morreu. (CZ06-12)

 

Em razão do total desuso do clítico e, sobretudo, da ausência sistemática de flexão verbal no plural, inviabilizando o reconhecimento de construções próprias de passiva sintética e de sujeito indeterminado nesse dialeto afro-rural do PB, adotei, nos contextos analisados, como critério para classificar como ergativas certas construções  ambíguas, a identificação, no argumento externo do verbo ergativo, da função temática de Tema ou Paciente, em razão do sentido passivo que expressa no contexto, ou da condição de “elemento afetado” pela ação expressa no processo,[18]  observando   ainda a ordem  DP V, V DP, a função discursiva do DP e o contexto anterior. Trata-se, geralmente, de construções ativas com sentido passivo, comuns no PB. Observem-se, a propósito, três casos com o verbo tirar, flexionado na 3ª pessoa do singular:

 

(27)

a. E agora nós só tem mêi pão, porque tirô a invencibilidade nossa, qu’era a casa de farinha. (CZ06-6)

b. se nós tavo com um pão e mêi, nós ficô só com mêi pão, porque o pão tirô.

c. O carro num podia tirá [do atoleiro]. (CZ06-17)

 

Em (27 a), o argumento do verbo, a invencibilidade nossa, está em posição pós-verbal, e em (27 b e c),  os argumentos O carro e o pão iniciam suas respectivas orações. Todos têm a função temática de Tema, são os elementos afetados no processo e seu  sentido passivo é, pois, fora de dúvida (podem-se interpretar a), b) e c), respectivamente, como: “ foi tirada a invencibilidade nossa”, “o pão foi tirado de nós”, “o carro não podia ser tirado do atoleiro”).[19]  Não há referência, no contexto anterior, a um agente para esses eventos.

Outro caso, com o verbo espalhar (em (28)), em que o DP esse negoço, que representa a entidade afetada pela eventualidade expressa pelo verbo, está em posição pós-verbal (como o exemplo com o verbo tirar em (27 a)):

 

(28) quando espalhô esse negoço [do empréstimo], escapô a visão. (CZ06-11)

 

 Seria possível considerar aí outras duas leituras, entendendo, na primeira, tratar-se de sujeito indeterminado com o verbo no singular (já que não há flexão de plural) ou, na segunda, de passiva sintética sem o se, porque desusado. Na primeira hipótese, a leitura seria: “quando espalharam esse negócio...”. E  na segunda:  “quando se espalhou esse negócio...”. Todavia, tanto em (27), quanto em (28), a ergatividade dessas construções se evidencia, levando em conta as situações discursivas em que se inserem.

Observe-se, ainda, que, nesse dialeto rural, não parece haver muita restrição semântica na seleção de “sujeitos” para o uso intransitvo-ergativo de um verbo transitivo; algumas construções ergativas que podem parecer estranhas ao nosso ouvido, no entanto, são comuns na fala desse informante. São construções ativas com indiscutível sentido passivo.[20] É o caso do exemplo em (27c), aqui repetido como (29), a que acrescento, identificando, no mesmo caso, a sentença em (30), encontrada em Wenceslau (2003, p. 65), que a apresenta como exemplo de construção ergativa, comum no dialeto mineiro.

 

(29) o carro num podia tirá [do atoleiro] (CZ06-17)

(30) O bebê amamentou. (op. cit., p. 65)

 

Assim, como não seria possível o uso intransitivo/ergativo, por exemplo, do verbo quebrar em Ele quebrou a promessa, dizendo que *A promessa quebrou,[21] também não seria de esperar a ergativização de amamentar no exemplo em (30). Quanto ao caso de (31), observa-se, ainda, no caso de (31), um uso mais causativo do verbo imprensar em Imprensei o dedo. No primeiro caso, parece haver uma restrição semântica mais forte em razão do sentido conotativo dado ao verbo quebrar, empregado como descumprir. Mas no exemplo em (29), do inquérito, observa-se também um outro sentido para o verbo tirar, o de sair[22], e a realização  do DP na posição de sujeito, como tópico discursivo. [23]

De referência ao emprego da ordem SV ou VS nas construções ergativas, observei variação, com um maior número de construções na ordem SV, 26 casos, como em (31 a), para apenas 10 construções na ordem VS (31 b, c e d). De referência ao preenchimento da posição de sujeito versus sujeito nulo, foi possível observar a preferência pelas construções situadas no primeiro caso: 36 exemplos encontrados, para 23 de sujeito nulo, pro. Confirmando a ausência absoluta de concordância do verbo com o sujeito no plural (como em  (32 a)), também entre os verbos ergativos, verifiquei o emprego freqüente do preenchimento da posição de sujeito apenas na primeira oração, nos períodos com duas ou mais orações com o mesmo sujeito referencial (32b), o que é comum no PB em geral.

 

(31)

a. o motô sem ligá... sem ligá, tá!... o dedo impressô aqui. (CZ06-1)

b. Não, num ligô a casa de farinha... (CZ06-7)

c. num é possive que num ligue o minho dessa casa de farinha. (CZ06-11)

d. mas nessa região nossa aqui, juntô até água. (CZ06-13)

 

(32)

a. e os carro começava a atolar  (CZ06-19)

b. a água vai juntano e só vai fundano, até cabá na lataria. (CZ06-17)

 

No exemplo em (31b), o DP pós-verbal  é um anti-tópico (deslocado à direita), e o DP do exemplo em (31c), também pós-verbal, é um DP pesado, o que também justifica a ordem VS da sentença, a qual ocorre ainda no exemplo em (31d), cujo DP é a  informação nova, o foco informacional.

 

 

3 Considerações finais

 

Neste estudo preliminar, abordei o fenômeno da inacusatividade e da ergatividade à luz da teoria gerativa, identificando, além dos verbos inacusativos propriamente ditos, certas construções cujas características as legitimam como inacusativas.

Detendo-me, então, nos verbos inacusativos e nos ergativos, cujas diferenças justificam seu estudo em separado, procedi a um levantamento desses verbos no Inquérito de nº 06, de acordo com a classificação adotada, e encontrei, na fala do informante, um emprego significativo de verbos inacusativos de todos os tipos considerados (de mudança de estado, de movimento, de existência e de aparição), bem como de ergativos. 

Analisando as construções com esses tipos de verbos, em que procurei destacar certas particularidades encontradas, detive-me sobre três itens: concordância verbal, preenchimento da posição de sujeito versus sujeito nulo e ordem SV/VS. De referência ao primeiro item observado, constatei a total ausência de marcas morfológicas de plural indicativas da concordância verbo-sujeito no plural, comprovando assim a tão propalada redução ou simplificação do paradigma flexional nas variedades populares do PB, porquanto, de seis formas previstas pela norma padrão, essa realidade oral analisada, representativa de uma variedade popular do PB, apresenta, praticamente, um paradigma de duas formas de flexão verbal (eu vou; você, ele, ela vai; nós, eles, elas, a gente vai). Vale ainda registrar também a ausência de certas marcas flexionais de subjuntivo.

Quanto ao segundo item, considerando ser o português uma língua de sujeito nulo, ou língua pro-drop, que pode deixar de realizar lexicalmente o sujeito, referencial ou não, e tendo em vista que o PB, em razão da ter reduzido seus paradigmas flexionais, vem apresentando aumento na freqüência de sujeitos lexicais, observei variação no que diz respeito a preenchimento da posição de sujeito versus sujeito nulo, com maior incidência de casos com a posição de sujeito preenchida. Identifiquei também uma constante no preenchimento apenas da primeira posição de sujeito, em contextos de duas ou mais orações com o mesmo sujeito referencial.

Por fim, considerando ainda a possibilidade de um provável enrijecimento na ordem sujeito-verbo-objeto no PB, como conseqüência do aumento na freqüência de uso de sujeitos lexicais, observei variação no emprego da ordem SV e VS, com preferência pela ordem SV, exceto no caso dos verbos existenciais (excluindo os existenciais locativos, entre os quais a ordem SV também é majoritária) e de aparição, em cujas construções a regra é a ordem VS. Constatei, ainda, o largo emprego de ter existencial, o que confirma seu predomínio no PB, em detrimento do uso de haver e de existir, ausentes em todo o inquérito.

 

 

Referências

 

BERLINCK, R. de A. (1988). A ordem no português do Brasil: sincronia e diacronia. Dissertação de Mestrado. Campinas: Unicamp.

BURZIO, L. (1986). Italyan syntax: a government and biding approach. Dordrecht: D. Reisel Pb. Co.

CANÇADO, Márcia. (1995). Verbos psicológicos: a relevância dos papéis temáticos vistos sob a ótica de uma semântica representacional. Tese de Doutorado. Campinas: IEL/UNICAMP.

DUARTE, Inês. A família das construções inacusativas. (, 2003). In: MIRA MATEUS et al., Gramática da língua portuguesa, 5. ed. Lisboa: Caminho, p. 507-548.

FIGUEIREDO SILVA, Maria Cristina. (1996). A posição sujeito no Português Brasileiro: frases finitas e infinitivas. Campinas: Ed da UNICAMP.

HAEGEMAN, Liliane. (1996). Introduction on government and biding theory, 2nd. ed.  Oxford: Blackwell Publishers Ltd.

LEVIN, Beth and HOVAV, Malka Rappaport. (1999). Unaccusativity: at the syntax-lexical semantics interface. Cambridge: The MIT Press.

MATTOS E SILVA, Rosa Virgínia. (2000). Nos limites finais do período arcaico: a vitória de ter, “verbo de posse” e auxiliar de tempo composto e  sua emergência como “verbo existencial”.  Revista do GELNE – Grupo de Estudos Lingüísticos do Nordeste. MARIA ELIAS SOARES (Org.) Fortaleza, vol. 2, nº 1, 2000, p.117- 121.

PONTES, Eunice. (1986). Da sintaxe ao discurso. São Paulo: Ática.

SILVA, Cláudia R. T. (2004). A natureza de AGR e suas implicações na ordem VS: um estudo comparativo entre o português brasileiro e o português europeu. Tese de Doutorado. Maceió: Universidade Federal de Alagoas.

WENCESLAU, Fábio de L. (2003). Verbos beneficiários: um estudo na interface entre semântica e sintaxe. Dissertação de Mestrado. Belo Horizonte: Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais.


 

[1] Os verbos plenos, também chamados de verbos principais, compõem o núcleo semântico de uma oração. São núcleos lexicais plenos, que se caracterizam por determinadas propriedades de seleção semântica (número de argumentos e correspondentes papéis temáticos) e sintática (categoria de cada argumento e relação gramatical que estabelece na oração). Ao contrário, os verbos predicativos, de cópula ou de ligação, também tradicionalmente chamados  de verbos de significação indefinida, são verbos que só selecionam semanticamente um argumento interno, uma mini-oração, cujo sujeito se apresenta com a relação gramatical de sujeito da frase  copulativa, e cujo núcleo tem a relação gramatical de predicativo do sujeito.

[2] Os argumentos que se projetam na posição de sujeito (argumento externo) e de complemento (argumento interno) de um verbo.

[3] As línguas de sujeito nulo,  também chamadas de línguas pro drop, como o italiano e o espanhol, são línguas que admitem construções em que a posição do sujeito se apresenta foneticamente vazia, enquanto nas línguas não pro drop, como o inglês e o francês, existe a obrigatoriedade de preenchimento dessa posição.

[4] Os argumentos são referidos, chamando-os de DPs e não de NPs, uma vez que a categoria lexical NP (do inglês nominal phrase, sintagma nominal), que tem como núcleo um nome, N, é dominada por uma categoria funcional DP (determiner phrase, sintagma determinante), cujo núcleo D constrói a referencialidade do NP, conferindo-lhe o estatuto de argumento.

[5] Essa posição de sujeito é marcada casualmente pelo núcleo flexional, Infl, numa relação Spec/núcleo, resultando na concordância verbal.

[6] De acordo com a Teoria da Regência e da Ligação da Gramática Gerativa a que está atrelado este trabalho, o complemento do núcleo verbal é seu argumento interno, um DP, dele devendo receber caso, para satisfazer o Filtro do Caso – princípio segundo o qual todo DP pronunciado deve ter caso. O caso torna o DP visível para a interpretação temática.

[7] Sobre as construções de tópico no português europeu, consulte-se Duarte (2003, p. 316-321).

[8] Sobre as construções de foco no português europeu, consulte-se também Duarte (2003, p. 316-321).

[9] Cito, entre outros, Burzio (1986, apud HAEGEMAN, 1996), Belletti (1988), Ambar (1992, apud SILVA, 2004) e Duarte (2003).

[10] Isso pode ocorrer, tendo em vista a variação interlingüística atestada entre o PB e o PE  no que diz  respeito à ordem do sujeito em  relação ao verbo (veja-se, a propósito, SILVA, 2000).

[11] Os verbos de movimento que denotam o modo do movimento são intransitivos, como andar, nadar, correr, saltitar, etc.

[12] Alguns autores, como Levin e Hovav (1999) e Duarte (2003), por exemplo, não usam essa denominação de “verbos ergativos”, que incluem entre os inacusativos, salientando, apenas, que são verbos de mudança de estado devida a causa externa. Outros lingüistas, cuja posição assumo neste estudo, destacam os verbos ergativos dos inacusativos. Tal é o enfoque de Haegeman (1996), por exemplo, que afirma não ser possível chamar os verbos ergativos de inacusativos, principalmente pelo fato de esses verbos terem uma contraparte transitiva que atribui caso acusativo a seu complemento direto.

[13] Quanto ao emprego da marca morfológica de concordância dentro do DP plural, no inquérito nº6, o comum é só ocorrer no primeiro elemento e, às vezes, em mais de um deles, mas não em  todos, como em (11 a).

[14] Sobre esse assunto, consulte-se Figueiredo Silva (1996,  p. 95),  Silva (2004, p. 70) entre outros.

[15] Neste artigo, não trato das ocorrências com o verbo ser impessoal (nas indicações de horas, datas, distâncias), para cuja consulta remeto às construções copulativas, em Guilhermina Carvalho, Inacusatividade e ergatividade na fala  rural do PB, dissertação de Mestrado, em fase de elaboração.

[16] Pretendo encontrar respostas explicativas para as questões que foram aqui levantadas na descrição e análise desses dados iniciais, quando da conclusão da pesquisa  que se  encontra em fase inicial de elaboração, a qual deve  estender-se por três comunidades rurais afrodescendentes e se constituirá na minha dissertação de Mestrado.

[17] Sobre a perda do clítico na gramática do PB urbano, consulte-se Silva (1996)

[18] A propósito da expressão “elemento afetado”  veja-se Cançado, 1995.

 

[20] Isso pode explicar o número bastante reduzido, no texto, de construções passivas (analíticas, porque a passiva sintética não ocorre, nem aquele outro tipo de construção de sujeito indeterminado com o clítico se e o verbo intransitivo ou transitivo indireto no singular, do tipo Precisa-se de pedreiro).

[21] Confira-se a esse respeito as observações de Levin e Rovav (1999), cujo exemplo citado Ele quebrou a  promessa  foi extraído do texto dessas autoras.

[22] Esse emprego do verbo tirar com o sentido de sair  faz lembrar a ocorrência, no francês, de sortir  (sair), com o sentido de tirar  em Il a sorti le porte monnaie de la  poche  (Ele tirou a carteira do bolso).  

[23] As estratégias de preenchimento da posição de sujeito e de tópico, usadas pelo falante do PB e registradas pelas pesquisas lingüísticas (Pontes, 1986,  Berlinck, 1988, entre outros)  parecem confirmar a ocorrência de preferência pela ordem SV ou TÓPICO/SV  no PB.

 
 
 

 

COMO CITAR ESSE ARTIGO

CARVALHO, Guilhermina Mendes de. Inacusatividade e ergatividade na fala rural do PB. In: Revista Inventário. 5. ed., mar/2006. Disponível no web world wide em: http://www.inventario.ufba.br/05/05gcarvalho.htm.

 

 




Os conceitos emitidos em artigos e resenhas assinados são de absoluta e exclusiva responsabilidade de seus autores.
Todos os direitos reservados.
Nenhuma parte desta revista poderá ser reproduzida ou transmitida sejam quais forem os meios empregados, sem permissão por escrito do Conselho Executivo e dos autores dos artigos e/ou resenhas.