Edições anteriores |
|
|||||||||||||
Questões sobre a “indeterminação” do sujeito
Gredson dos Santos Mestre em Letras / PPGLL-UFBA gredsons@bol.com.br
Resumo O artigo apresenta as divergências entre gramáticos e lingüistas no que tange à análise de enunciados em que o verbo é acompanhado da partícula se. Com isso, pretende-se demonstrar que parte da polêmica está relacionada à imprecisão dos conceitos de sujeito e indeterminação, o que pode gerar um falso problema em torno da questão. Palavras-chave: indeterminação; sujeito; agente; imprecisão terminológica.
Abstract: This paper presents the controversies between gramatics and linguistics in their analyses of enunciates when the verb is followed by the pronoun “se”. therefore, we expect to give an evidence that part of this polemics is related to an inaccuracy of concepts of subject and indetermination, that the can cause a false problem regarding the question. Key-words: indetermination; subject; agent; terminological imprecision;
1. Introdução
O problema da “indeterminação” do sujeito em construções com o verbo acompanhado do pronome se no Português do Brasil (daqui para a frente PB) tem sido abordado, além de pelas gramáticas normativas, por vários pesquisadores, a exemplo de Nunes (1991), Rollemberg et all (1991), Monteiro (1994) e Bagno (2000). As controvérsias estão relacionadas com a classificação que se deve dar à partícula se e com a possibilidade de o sujeito estar ou não indeterminado. Em enunciados como
(1) Vendem-se casas. / (1a) Vende-se casas. (2) Concerta-se sofá. (3) Precisa-se de funcionários. (4) Vive-se bem nesta casa. (5) Está-se feliz aqui.
a posição das gramáticas normativas é bastante categórica: ou o se deverá ser classificado como uma partícula apassivadora (quando acompanhado de verbo transitivo direto, tendo, nesse caso, sujeito definido simples, que deverá concordar com o verbo que se encontra na voz passiva sintética ou pronominal) ou índice de indeterminação do sujeito – quando acompanhado de verbos intransitivos, transitivos indiretos ou de ligação, que deverão sempre ser empregados na terceira pessoa do singular. Um dos maiores problemas para esse tipo de análise é o aparecimento de construções como (1a). Embora a gramática normativa considere enunciados desse tipo como agramaticais, eles aparecem com uma freqüência tão grande, que são quase categóricos nas normas populares e muitíssimo recorrentes nas variedades consideradas cultas do PB, conforme apontam as pesquisas de Nunes (1991), Monteiro (1994) e Bagno (2000), bem como as observações de Said Ali, em 1919 e 1964. Este artigo discutirá o problema em duas seções: a primeira constituir-se-á de uma revisão sobre o que argumentam alguns gramáticos e alguns lingüistas; a segunda seção pretende demonstrar como a imprecisão terminológica dos conceitos de indeterminação e mesmo de sujeito – problema que aparece tanto nas gramáticas normativas quanto em trabalhos científicos – pode entravar o entendimento da questão e, ao mesmo tempo, criar um falso problema em torno do assunto.
2. Controvérsias em torno do se
2.1. A posição dos gramáticos
Segundo Cunha e Cintra (1965: 297-8), o pronome se pode ser empregado como a) objeto direto, b) objeto indireto, c) sujeito de infinitivo, d) partícula expletiva, e) parte integrante do verbo, f) pronome apassivador e g) símbolo de indeterminação do sujeito. Para exemplificar f) e g), os autores citam, respectivamente, dois exemplos:
(6) Ouve-se ainda o toque de rebate. (7) Fez-se novo silêncio. (8) Vive-se ao ar livre, come-se ao ar livre, dorme-se ao ar livre. (9) Martelava-se, serrava-se, acepilhava-se.
Fazem ainda a seguinte observação:
Em frases do tipo:
Vendem-se casas. Compram-se móveis.
consideram-se casas e móveis os sujeitos das formas verbais vendem e compram, razão por que na linguagem cuidada se evita deixar o verbo no singular. A posição de Cunha e Cintra, no que tange ao problema da “indeterminação” do sujeito, é similar à adotada por outros gramáticos. Ao falarem sobre as vozes verbais, e mais especificamente sobre a voz passiva, os referidos autores afirmam que esta pode ser expressa com “o pronome apassivador se e uma terceira pessoa verbal, singular ou plural, em concordância com o sujeito.” Logo após, citam os seguintes exemplos:
(10) Não se vê [= é vista] uma rosa neste jardim. (11) Não se vêem [= são vistas] rosas neste jardim.
Embora não apresente um capítulo específico sobre a classificação da partícula se ou do sujeito, Bechara (1999) comenta alguns aspectos relativos à questão do que, em geral, não são apresentados em compêndios normativos, mas não se afasta da posição geral dos demais gramáticos. Discutindo o problema da concordância verbal, no tópico A concordância com verbo na passiva pronominal, o autor assim se posiciona:
A língua padrão pede que o verbo concorde com o termo que a gramática aponta como sujeito:
Alugam-se casas. Vendem-se apartamentos. Fazem-se chaves (p. 433) Conforme o que se viu, em suma, a posição dos gramáticos em geral, em frases como as que nos servem de exemplo, é a de analisar o se como pronome apassivador, se acompanhado de verbo transitivo direto; ou como índice de indeterminação do sujeito, se acompanhado por verbos de outras predicações.
2.2 A posição dos lingüistas Em direção oposta, todavia, segue a argumentação de pesquisadores das mais diversas orientações teóricas. As posições desses lingüistas, em geral, caracterizam-se por evidenciarem que, mesmo em frases como (1a) e (2), o falante interpreta os enunciados como ativos, e frases como (1) têm sua ocorrência restrita a contextos bastante monitorados e estão vinculadas à influência da escolarização, podendo-se mesmo afirmar que enunciados desse tipo já não fazem parte da gramática de falantes das normas populares e de, pelo menos, boa parte dos falantes das normas cultas do PB. Num trabalho intitulado se indeterminador: o percurso diacrônico no português brasileiro, Jairo Nunes, seguindo a linha de pesquisa proposta por Tarallo e Kato (1989), procura rastrear o percurso diacrônico do se apassivador no português brasileiro. Analisando quatro amostras, compostas por cartas, diários e documentos – uma amostra recobrindo os anos entre 1555 e 1989, um corpus sincrônico constituído de 10 horas de gravação e dois corpora contrastivos, compostos por entrevistas de falantes do português europeu (doravante PE) e de reportagens da revista Veja – Nunes constata o que Naro (1976) observara: o se passivo precede o se indeterminador, que é relativamente recente. Nunes ainda observa que “pelo menos em relação às construções com verbos transitivos, o português europeu falado praticamente se mantém estável em relação à variação provocada pelo surgimento do se indeterminador”, havendo, assim, no português europeu moderno (doravante PE), uma preferência pela construção com o se apassivador. Já o PB se distingue exatamente pela tendência oposta. De acordo com o estudo, a aplicação da discordância verbal com a partícula se em construções com verbos transitivos diretos aumentou de modo bastante claro, embora não se possa fazer nenhuma afirmação categórica em relação aos dados fornecidos pelas entrevistas; ainda assim, isso permite afirmar que o PB, cada vez mais, vem dando preferência à construção inovadora, afastando-se do PE. Além disso, a concordância em construções com o se, no atual estágio, reflete mais uma monitoração na modalidade escrita da língua do que propriamente algo do domínio do vernáculo. Após essas constatações, o autor aventa uma hipótese para explicar o fenômeno: o surgimento do se indeterminador foi desencadeado por um processo de reanálise sintática da antiga construção com se apassivador. Nunes indaga também sobre que elemento especificamente incidiu o processo de reanálise, oferecendo três possibilidades, que, para ele, são aspectos do mesmo fenômeno:
a) reanálise do clítico: o se apassivador teria passado de elemento identificador da estrutura do predicado a participante da relação anafórico-pronominal que se estabelece com o pronome nulo da posição de sujeito – daí, se o elemento nulo da posição de sujeito recebe o papel temático, o argumento interno recebe caso acusativo; b) reanálise do argumento interno: o argumento interno teria passado de sujeito a objeto do verbo – considerando tal hipótese, pode-se dizer que o fato de o argumento interno receber o caso acusativo implica que a posição de sujeito recebe o papel temático do argumento interno e o clítico não pode absorver nenhum papel temático; c) reanálise da categoria vazia da posição de sujeito: o expletivo que ocupa aposição de sujeito teria sido reanalisado como um pronome nulo referencial, que é indeterminado pelo clítico se – nesse caso, sendo a posição do sujeito temática, o argumento interno recebe caso acusativo.
O estudo ainda aponta que, no PB, o uso crescente de se indeterminador deve ter-se dado sob influência direta da posição ocupada pelo argumento interno em estrutura –S. Apresenta dados que indicam que, durante todo o processo de mudança, as locuções verbais favoreceram a implementação da discordância entre o verbo e o argumento interno. Voltando-se para questão da expansão do se indeterminador, o estudo levanta a hipótese de que “a expansão deve ter se dado de acordo, em primeiro lugar, com a presença de argumento externo na posição de sujeito; e, em segundo lugar, com a semelhança estrutural em superfície”. Outra hipótese considerada aceitável pelo autor do trabalho é a de que a expansão do se indeterminador foi sensível aos diferentes tipos de verbo de alçamento. Até esse ponto, o estudo mostra o percurso do se: de exclusivamente apassivador a indeterminador. Em outra seção, o estudo já aponta o desaparecimento dessa partícula, que está relacionado ao fato de que, enquanto o PE possui uma referência determinada na identificação do pronome nulo de terceira pessoa do singular em sentenças finitas, o PB possui uma referência indeterminada, inovação que teria surgido de construções indeterminadas com o verbo na terceira pessoa do plural, como em (12) ou de construções com o se indeterminador em frases em que esse elemento já teria passado pelo processo de reanálise, como em (12) e (13), exemplos extraídos do trabalho que ora se resenha:
(12) Nos nossos dias não usam mais saias. (13) Nos nossos dias não se usa mais saia.
Para Nunes, a primeira hipótese é aceitável na medida em que o PB admite paradigmas como ele/eles fala; já a segunda se apóia no quadro geral de supressão de clíticos no PB. Desse modo, então, afirma que “construções finitas com terceira pessoa do singular com referência indeterminada encontram sua mais razoável fonte originadora junto às construções com se indeterminador”. Nunes apresenta dados que mostram que é no século XIX, momento em que as construções com se indeterminador se tornam majoritárias no PB, que o clítico se começa a ser suprimido. Assim, nota-se um novo quadro de variação: as construções com se indeterminador estão disputando espaço com o fenômeno da supressão do se, que já alcança um nível de 78% e aparece nos três níveis de escolaridade. Além disso, elisão do se atinge índices mais altos em entrevistas com falantes de baixa escolaridade; mas, apesar de ter uma ocorrência média de 50% menos em falantes de nível superior, o fenômeno está se generalizando. Se, por um lado, no PB, diferentemente do PE, o se é suprimido em sentenças finitas, por outro, esse elemento está sendo inserido em sentenças com o infinitivo, algo que pode se estender ao gerúndio – fenômeno esse que não deve, conforme avalia Nunes, ter surgido antes do século XIX, momento em que em a construção com o se indeterminador se tornou majoritária no PB, de modo que se pode mesmo afirmar que o processo de inserção ocorre de modo similar à expansão das construções com se indeterminador. O estudo apresenta ainda uma seção em que o autor faz uma avaliação sincrônica das formas inovadoras em textos da revista Veja, constatando:
· Apesar do cerceamento normativo, não há na linguagem jornalística muita repulsa à discordância entre verbo e argumento interno; · Veja assume formas inovadoras sem concordância como adequadas ao discurso jornalístico; · Em relação à elisão do se indeterminador, comprova-se que esta inovação ainda não é muito freqüente no texto jornalístico; · As construções com inserção do se junto a infinitivos são as que têm maior prestígio dentro do que se pode estabelecer como modalidade escrita padrão.
Em conclusão, o trabalho destaca que o PB deu prosseguimento à mudança que vinha expandindo os contextos em que operava se indeterminador, em detrimento do se apassivador. Ademais, o ponto alto do processo de afastamento do PB em relação ao PE se dá no século XIX, momento em que o Brasil começa a dar preferência pelo se indeterminador – mudança essa que, articulada a outros rearranjos do sistema, deu espaço para outras duas mudanças: a elisão de se em contextos finitos e sua inserção em contextos infinitos. Outro importante trabalho é o de Monteiro (1994), que, numa seção intitulada A questão do se, faz uma revisão de outros trabalhos sobre o tema e apresenta uma posição bem clara acerca do tema. Corroborando a posição de Naro (1976), Maurer Jr (1951b), Sá Nunes (1954) e Aguiar (1971), Monteiro afirma que o emprego básico de se tem sido o de reflexivo e daí passou a relacionar-se a sujeitos não animados e a verbos intransitivos. Sustenta inda o autor que o se indeterminador derivou-se do se apassivador, em decorrência do processo de reanálise sintática: o sujeito paciente passou a ser interpretado como objeto direto e o se passou a ter valor indeterminado. Refutando a hipótese de Macambira (1985), para quem o se indeterminador deve ter existido antes do se apassivador, Monteiro argumenta que este remonta ao latim e só se conserva na fala culta atual por causa da escola. Cita também Said Ali (1960), que apontou incoerências na análise tradicional do se como apassivador em construções do tipo “aluga-se esta casa”, “compra-se o palácio”, “morre-se de fome” etc, em que o se sugere na consciência de qualquer falante, a idéia de alguém que aluga, que compra ou que morre. Transcrevendo exemplos extraídos do NURC, Monteiro conclui que “em todos esses enunciados, não nos parece lógico admitir-se a existência de construções passivas” e argumenta que, para muitos estudiosos, o se deve ser interpretado como um recurso de que dispõe a língua para marcar a indeterminação:
· Silveira (1924) já tinha percebido que o se perdeu em português a função de apassivador por ocorrer agregado a verbos intransitivos e pelo desuso do agente da passiva; · Aguiar (1971) busca elementos para confirmar sua hipótese de que o se em português passou a indeterminar o sujeito de qualquer verbo; a princípio tinha a função de reflexivo, daí evoluiu para apassivador e indeterminador de verbos intransitivos e, finalmente, indeterminador; · Costa (1987) opina que a função de se apassivador está sendo englobada pela de se indeterminador; · Ikeda (1977) e Milanez (1982) propõem que o se, no PB, constitui sempre indeterminação, não importando a predicação do verbo; · Retomando Said Ali, Milanez lembra que todos os gramáticos consideram correta e não mais passiva a construção “adora-se aos ídolos”.
Após citar todos esses estudiosos, Monteiro faz a seguinte observação: “A interpretação passiva das construções com o se parece ter sido mais um equivoco, e dos maiores, da nossa tradição gramatical”. O autor ainda cita Castelar de carvalho (1990), que aponta uma série de contradições na doutrina gramatical, e comenta o trabalho de Nunes (1991), segundo o qual somente no século XIX é que a tendência a não flexionar o verbo no plural se tornou irreversível e que atualmente essa mudança já se acha quase realizada, em decorrência de um processo de reanálise sintática. Por fim, Monteiro comenta que, com relação ao PB, convém não radicalizar, pois a construção ainda se encontra em fase de mudança e por isso o sentido passivo vez por outra se faz notar. E completa: “aceitamos que estruturas se + vtd não exprimem passividade e se nivelam a estruturas se + vi”; além disso, o se costuma ser apagado, despindo o verbo de qualquer marca de passividade. Um argumento adicional é o de que há vestígios de que a mudança ainda não se concluiu, pois a construção passiva com o se preserva dois traços bem marcantes, relacionados com a posição do sujeito e a colocação do clítico – tais traços, entretanto, podem estar perdendo sua funcionalidade. Bagno (2000), dedica-se ao problema do numa seção intitulada Pseudopassiva sintética ou pseudopassiva pronominal, que se encontra no capítulo A subversão herética do ensino de língua: pela intervenção consciente no padrão lingüístico. A proposta do autor é demonstrar que as construções tradicionalmente chamadas de passivas sintéticas não são passivas, evidenciar os equívocos e preconceitos da análise normativista feita pelo que ele chama de “comandos paragramaticais” e propor uma nova postura a ser adotada pelos professores de língua portuguesa em ralação a esses e outros aspectos da sintaxe do PB. A pesquisa estuda um corpus constituído de dois conjuntos, um de língua falada, composto por dez entrevistas, do tipo DID e D2, de 13 informantes, moradores de cada uma das capitais estudadas pelo projeto NURC, e o outro de língua escrita, composto por seis edições dos jornais de grande circulação em Salvador, São Paulo, Rio de Janeiro, Recife e Porto Alegre. Bagno ainda menciona que todos (sic) os estudos científicos têm se empenhado em mostrar que o se deve ser interpretado como um recurso de que a língua dispõe para marcar a indeterminação do sujeito. O autor destaca o caráter nominativo do se e atribui a isso o seu apagamento nas orações em que o sujeito [-animado] pratica uma ação que incide sobre si mesmo, como em “a porta se fechou/o vaso se quebrou”. Para Bagno, a ordem dos termos na sentença é crucial para determinar o status do se: pronome reflexivo ou índice de indeterminação do sujeito – percebe-se, então, que o autor não aceita a possibilidade de o se ser classificado como apassivador em nenhum contexto. Bagno transcreve um exemplo do NURC, em que aparece
(14) Havia uma preocupação de se formar doutores...
e afirma que a frase obedece à ordem canônica do português:
Donde se conclui, segundo o autor, que o falante faz uma análise intuitiva do se como sujeito. Observe também os seguintes exemplos, extraídos de Bagno:
(15) Muita gente já se demitiu da Ford – sujeito: muita gente; (16) Já se demitiu muita gente da Ford – sujeito: indeterminado; objeto: muita gente; (17) Muita gente já foi demitida da Ford – verdadeira passiva; sujeito: muita gente.
Discute os exemplos comenta: “Me parece claro, portanto, que a flexão do verbo no singular ou no plural é estreitamente dependente do significado que se quer atribuir e dos efeitos que se busca obter com ele. O uso simultâneo dos critérios sintático, semântico e pragmático é que deverá definir, repito, o status reflexivo ou indeterminador do sujeito do clítico se[1]” (p. 224) Considera que, nas construções com se indeterminador, ocorre uma nítida tematização do verbo, ficando os outros dois argumentos caracterizados depois deles como rema. Daí se pode concluir que o português é tão caracteristicamente nominativo temático que toda seqüência verbo-nome é analisada como (S)VO. Prova disso é que as passivas ser + particípio ocorrem com baixa freqüência na língua. Por isso, quando o verbo é tematizado, tem-se orações ativas com se indeterminador; quando o sujeito é tematizado, tem-se as orações reflexivas, em que o se tem papel acusativo. Aponta ainda que a reanálise do se pelos falantes brasileiros é um fenômeno análogo à reanálise do mesmo elemento pelos falantes do espanhol falado na América latina. Após uma longa seção em que o autor cita vários trechos de análises normativistas sobre essa questão, destaca que a atenção dada por aqueles ao fenômeno da “pseudopassiva sintética” é um indício de que a análise desse tipo de enunciado como ativo por parte dos falante do PB já se impôs como majoritária. Outro aspecto discutido no trabalho diz respeito à inclusão do se nas construções com infinitivo; as análises de Bagno parecem estar de acordo com o tratamento que Nunes deu ao problema:
Quando tantas pessoas falam e escrevem “problema difícil de se resolver” elas analisam tal frase como problema difícil de a gente resolver. Os gramáticos atribuem a tal frase o valor passivo, enquanto o falante analisa intuitivamente como ativa. Tal análise se combina com a tendência, cada vez maior, que o PB exibe na realização fonética do sujeito. Outra prova do vigor da análise do se com o sujeito por parte de muitos falantes está na tentativa de combinação pronominal que consiste me usar o se associado aos clíticos de terceira pessoa.
Após discussão, o autor apresenta os resultados de sua análise da ocorrência do se indeterminador no corpus de língua falada, em que foram encontradas um total de vinte e quatro ocorrências do se, das quais 75% (dezoito) constituem um uso não padrão. A partir desses resultados, chega à conclusão de que os falantes parecem evitar o uso de se indeterminador preferindo em seu lugar outras estratégias de indeterminação, tais como:
· Apagamento do se, que depende da escolaridade e já representa 79% dos usos – esse resultado parece confirmar os dados de Nunes (1991), que encontrou 78%; · Verbo conjugado na terceira pessoa do plural; · Uso de a gente e você genéricos – uso mais comum, já que, com ele, fica preservada a ordem SVO com um sujeito neutro, apenas aparentemente temático, uma vez que o dado mais importante está no verbo; · Estatísticas: 11 usos de a gente, 23 usos de se indeterminador e 144 usos de você genérico – usos esses que não são motivados pelo aspecto diafásico e/ou regional. Tal uso se assemelha ao mesmo que se faz do you inglês.
No corpus de língua escrita, foram encontrados os seguintes resultados:
· As ocorrências do se são muito escassas – no total 08, só duas estão empregadas da forma não padrão, o que talvez possa ser explicado pela preferência por outras estratégias de indeterminação do sujeito; · 12 usos de se indeterminador e 84 passivas verdadeiras – tal preferência pode sr explicada: os autores evitam as dificuldades impostas pela observância de regras ilógicas, que poderiam gerar enunciados agramaticais para o leitor.
As posições em contraponto acima descritas servem para mostrar que a “indeterminação” do sujeito, de um modo geral e, em particular, a análise do se nos enunciados em questão é um fenômeno para o qual ainda não foram encontradas explicações satisfatórias – ousamos dizer que isso se deve, em partes, à falta de uma terminologia adequada para designar certos aspectos da questão. A seção que segue tentará demonstrar isso.
3. O problema da “indeterminação” do sujeito é também problema de terminologia Na seção anterior, fez-se uma breve revisão de alguns trabalhos que discutem a questão da “indeterminação” do sujeito vinculada, mais especificamente, à análise do clítico se, evidenciado que as divergências entre gramáticos e lingüistas continuam e estão relacionadas, de um modo geral, ao fato de que a tradição gramatical faz uma análise que já não corresponde à realidade. Se, por um lado, ficou demonstrado que a gramática faz uma análise equivocada do se em contextos em que esse elemento já não indica passividade, por outro, pode-se perceber que a imprecisão do conceito de sujeito presente tanto na gramática normativa quanto em algumas análises científicas contribui para aumentar a polêmica, sem, no entanto, esclarecê-la, fazendo emergir até mesmo um falso problema em relação a alguns aspectos da questão. O objetivo desta seção é tentar demonstrar tais imprecisões. Para isso, são dados os enunciados:
(18) Come-se bem naquele restaurante. (19) Vende-se esta casa. (20) Vende-se sorvetes. (21) Pintam-se camisas. (22) Dizem que ele é injusto. (23) Diz que o prefeito vai melhorar a cidade. (24) Alguém está batendo na porta. (25) Claro, quanto mais cedo você descobrir... eh... quem causa a doença e você isolar esse foco, lógico que você está evitando que muitas pessoas fiquem doentes... (NURC-SSA, EF - inf. 046) (26) Então, todos os… os edifícios residências, a gente encontra... eh... apartamentos localizados em primeiro, segundo e às vezes até em terceiro subsolo... (NURC-SSA, DID – inf.224)
Excetuando-se (21), por um detalhe que mais à frente será considerado, as demais sentenças fornecem uma indeterminação do agente responsável pela ação expressa pelo verbo. Uma questão que se coloca inicialmente é: a análise gramatical afirma que em (24), (25) e (26) o sujeito das frases é determinado e simples, embora os termos apontados como sujeito possuam uma referência um tanto vaga; alguns trabalhos com orientação sociolingüística apontam que, na verdade, os sujeitos dessas frases é indeterminado. Em relação a (19) e (20) a questão é se o clítico indica a apassivação (posição defendida pelos gramáticos) ou indeterminação do sujeito (como propõem os lingüistas em geral) ou mesmo se ele é o próprio sujeito dessas frases, como quer Bagno (2000). Num trabalho intitulado Os pronomes pessoais e a indeterminação do sujeito na norma culta de Salvador, Rollemberg et al. (1991), a partir de uma amostra do corpus do Projeto NURC/Salvador, descrevem alguns recursos usuais em falante de Salvador para a “indeterminação do sujeito” que não são abordados pela gramática tradicional, entre eles o uso de você, nós, a gente, eles etc. Examinam também a sua relação com as variáveis categoria de texto e faixa etária dos informantes. Parte do trabalho destina-se a esclarecer as noções de indeterminação e sujeito, mostrando o quanto elas ainda são imprecisas, como se pode ler:
Apesar de as definições chamarem a atenção para o desconhecimento ou a não determinação desse agente verbal, na verdade o que desconhece ou não se pode determinar é a referência do sujeito: é ela que nos estritos limites da oração não está precisada, estabelecida. A imprecisão das definições – que, entre outros aspectos, não assinala o caráter humano do sujeito indeterminado – vincula-se, entre outras causa, ao fato de a gramática tradicional eleger como objeto de análise as unidades frasais, sem se estender ao contexto frásico-discursivo. (p.56-7).
Além de notarem a necessidade de maior precisão para as noções de sujeito e de indeterminação – elas devem ser de natureza semântica ou gramatical? – as autoras destacam que a indeterminação não diz respeito apenas ao elemento gramatical com função de sujeito, podendo ela se estender a outros elementos sintáticos da oração, como o complemento verbal, por exemplo. As autoras falam ainda de indeterminação da referência do sujeito e da impossibilidade de se especificar nominal ou numericamente a identidade do sujeito. Assim, para as autoras,
o sujeito oracional é uma função sintática indicada pela relação que os vocábulos têm entre si dentro da oração; deste modo, toda oração, à exceção da que contém verbo impessoal, possui sujeito. O sujeito, enquanto elemento gramatical, poderá vir, ou não expresso sob a forma de variados itens lexicais: sua ausência não se faz imprescindível quando indeterminado. (p.57)
A partir dessa observação, as autoras identificam dois grupos de indeterminação:
1) Formas verbais com sujeito sintático zero – como é o caso de construções como (18), (19), (20), (22) e (23); 2) Formas verbais com sujeito sintático preenchido – em que se encontram (24), (25) e (26).
Bechara (2000, p.409), numa seção intitulada conhecendo melhor o sujeito: núcleo e determinantes, assim define o sujeito: “chama-se sujeito à unidade ou sintagma nominal que estabelece uma relação predicativa com o núcleo verbal para constituir uma oração”. Mais adiante, na página 410, o gramático coloca: “sujeito é uma noção gramatical, e não, semântica, isto é, uma referência à realidade designada, como ocorre com as noções de agente e paciente. Assim, o sujeito não é necessariamente o agente do processo designado pelo núcleo verbal.” A partir das considerações de Rollemberg et al e de Bechara, e admitindo-se como plausível a hipótese de que o sujeito é uma função sintática que responde às necessidades estruturais do sistema do PB e que a agentividade está ligada ao aspecto semântico do sistema, podendo ela ser um traço do sujeito ou de outro termo sintático, adota-se neste trabalho a posição de que, na verdade, não faz sentido falar em indeterminação do sujeito em contextos como os que aqui são analisados, mas sim em indeterminação do agente da ação indicada pelo verbo – é o que acontece, por exemplo, num enunciado como eu fui assaltado, em que a função de sujeito cabe ao pronome, mas o agente não está especificado. É o que acontece também com frases como (24), (25) e (26). No caso dos enunciados em que o se aparece, considerando os grupos de indeterminação, conforme proposto por Rollemberg et al (1991), tem-se, de fato a indeterminação do agente da ação verbal, e não necessariamente o sujeito – enquanto elemento gramatical –, uma vez que este apenas não foi preenchido, como propõem as autoras. Entretanto, este tipo de análise não encontra unanimidade entre os estudiosos: se a argumentação de que em (24), por exemplo, o sujeito enquanto elemento gramatical está explicito e definido e que, na verdade, é o agente da ação enquanto componente semâtico-pragmático que está indeterminado parece ser adequada, o mesmo não se pode dizer dessa proposta aplicada a enunciados como (18), (19) e (20). Como explicar convincentemente que, em tais enunciados, o agente é indeterminado e o sujeito não está explicito, se levarmos em conta que o PB tende a se tornar uma língua cujo preenchimento da posição de sujeito é obrigatório? Bagno (2000) tenta uma explicação propondo que o se seja classificado como sujeito da oração. Após comentar alguns exemplos similares aos que propomos aqui, Bagno (2000, p.220) faz a seguinte observação, tentando sustentar sua hipótese: É essa poderosa evidência semântica que leva os falantes a manter esses verbos no singular, fazendo eles concordarem com o sujeito indeterminado[2], indicado na superfície do enunciado pelo clítico se.
Porém, surge outra questão: se o sujeito, nesse caso é indeterminado, como o verbo pode concordar com ele? Além disso, o conceito de sujeito utilizado aí se baseia no critério sintático ou semântico? Sujeito e agente são a mesma coisa? A partir dessa proposta, então, pode-se afirmar que um enunciado como “Jogaram uma pedra em mim.” o verbo concorda com o sujeito indeterminado? Em caso afirmativo, como isso é possível, se, embora o verbo esteja no plural, a ação pode ter sido praticada por um e somente um indivíduo? Em um ponto de sua argumentação, Bagno transcreve um exemplo do NURC, em que aparece o enunciado “havia uma preocupação de se formar doutores...”, já discutido acima e afirma que a frase obedece à ordem canônica do português:
Em seu trabalho, Bagno ora atribui ao se o papel de sujeito, ora afirma que ele é o próprio elemento indeterminador do sujeito – o que evidencia o problema da imprecisão dos conceitos de sujeito e de indeterminação utilizados por ele, embora tenha afirmado que “o uso simultâneo dos critérios sintático, semântico e pragmático é que poderá definir, repito, o status reflexivo ou indeterminador do clítico se” (p. 224). Em outro trecho, em que debate o problema das combinações do se com os clíticos, Bagno mostra os equívocos da análise que os gramáticos fazem do fenômeno: Curiosa também é a proposta de Sacconi (1998:302) para que se evite as combinações de se com os clíticos. Oferecendo o exemplo A mala está vazia; carrega-se-a com facilidade, diz o autor que há três possibilidades de evitar a combinação “errada”:
1) eliminando o pronome a; 2) substituindo o pronome a por ela; 3) usando a passiva “analítica” em vez de “sintética”.
Na primeira opção, ocorreria o apagamento do objeto (e não do “sujeito”, como supõe Sacconi), que já faz parte do sistema lingüístico do português do Brasil: ·A mala está vazia; carrega-se Ø com facilidade.
O resultado do segundo processo sugerido pelo autor é um enunciado que ele, bizarramente, considera correto: ·A mala está vazia; carrega-se ela com facilidade.
Sacconi considera correto o uso da forma ela no exemplo acima porque a analisa como sujeito do verbo carrega-se. Ora, essa é uma análise que com toda probabilidade encontraria forte resistência da parte da gramática intuitiva dos falantes cultos do português brasileiro, que, utilizando critérios semânticos mais coerentes (já que, no enunciado em questão, o verbo carregar exige um sujeito no mínimo [+ animado], traço semântico que o nome mala definitivamente não tem), interpretariam o enunciado como: “A mala está vazia; se [+ animado] carrega ela com facilidade”, o que resultaria numa análise sintática intuitiva em que o se é sujeito e o ela, objeto direto. (p.242).
Apesar de mostrar claramente a impropriedade da análise dada por Sacconi ao enunciado, Bagno apresenta outra proposta também questionável: o se deve ser considerado sujeito no enunciado “A mala está vazia; se [+ animado] carrega ela com facilidade”. Ora, se, como indica o próprio Bagno, o verbo carregar exige um sujeito [+ animado], como sustentar que, nesse caso, esse traço é fornecido pelo clítico? Entendemos que, nesse caso, o enunciado deixa margem para duas interpretações: a de que qualquer pessoa pode carregar ela [a mala] com facilidade e a de que ela [a mala] pode ser carregada com facilidade. Conforme estamos propondo, em ambas as interpretações o termo a mala é paciente da ação verbal – a questão é que o agente é que não pode ser definido com precisão, ou seja, está indeterminado. Eventualmente, um termo com função de sujeito pode ser portador dos traços [+ humano] e [+agente] ou [+/- humano] e [-agente], o que permite falar em sujeito ativo, por um lado, e, por outro, em sujeito paciente (neste caso, em construções como a mala pode ser carregada). Todavia, isso não é uma regra categórica. Desse modo, o que se propõe é que o se, em certos contextos, seja analisado como indicador da indeterminação do agente da ação ou até da referência do sujeito, como propõem Rollemberg et al (1991) e não do sujeito, que, enquanto elemento gramatical, pode não aparecer explícito, o que parece ser um fenômeno análogo ao que acontece em um enunciado como
(27) Chove. / Está chovendo.
em que, conforme Bechara (2000, p.408), a relação predicativa é não-referida, pois não admite sujeito explícito. Se avaliarmos enunciados como (18), (19), (20) e (27) no contexto mais amplo da tendência de o PB estar se tornando um língua em que a explicitação do sujeito é obrigatória, podemos aventar duas explicações para ocorrência de enunciados como aqueles: 1) a mudança ainda não se completou, fato que permite a ocorrência desses enunciados. Outro fato que parece confirmar isso é a ocorrência de construções como (21) e, que, apesar estarem ligadas à influencia da escola e ocorrerem em contextos bastante monitorados, ainda exprimem passividade. Por isso, inclusive, não se pode negar que um enunciado como ela [a mala] pode ser carregada com facilidade, de acordo com o que se viu acima, não pode ser formulado por um falante do PB; ou seja: a regra apresenta-se ainda como variável. 2) embora ainda não se tenha completado, a mudança está bem avançada, pois, ao que parece, enunciados como (27) são pouco freqüentes e, quando formulados, não raro surgem acompanhados de elementos que parecem ocupar a posição do sujeito, como em “aqui está chovendo”, que parece ser muito mais freqüente que (27) – o que só poderá ser comprovado com pesquisas mais aprofundadas. Além disso, a elisão do se e o uso de outros meios para indicar a indeterminação do agente – como nas frases (24), (25) e (26) – em lugar das construções com o se indeterminador podem estar associadas a essa mudança mais geral do PB. A análise do se como sujeito, como propõe Bagno (2000) parece ser plausível se se considera que sujeito e agente não são a mesma coisa, de acordo com o que se argumentou neste trabalho. Todavia, considerando o que Nunes (1991) constatara – o aumento da elisão do se – e o que apontam outras pesquisas, pode-se afirmar que considerar o se como sujeito é uma formulação que vai de encontro à tendência do PB de manter fixa a posição do sujeito e exigir sempre o seu preenchimento, embora a regra ainda não seja categórica. A partir de tais considerações, o presente trabalho argumenta em favor da necessidade de uma revisão crítica da terminologia utilizada tanto pela gramática tradicional (cf. Hauy 1987) quanto em trabalhos científicos, sob pena de se criar um falso problema em torno da questão ou mesmo entravar as discussões em torno do tema.
4. Considerações finais Este trabalho, num primeiro momento, fez uma revisão sobre como o problema da “indeterminação” do sujeito, em contextos com verbos acompanhados do clítico se, tem sido abordado pela gramática tradicional e estudado pela lingüística moderna. Numa segunda parte, o trabalho defendeu a necessidade de revisão da terminologia utilizada por gramáticos e pesquisadores e esboçou uma proposta de análise para o elemento em questão.
5. Referências
ALI, Manuel Said. (1964). Gramática histórica da língua portuguesa. São Paulo: Melhoramentos. BAGNO, Marcos. (2000). A “subversão herética” do ensino de língua. In: ______. Dramática da língua portuguesa: tradição gramatical, mídia e exclusão social. São Paulo: Loyola, p. 219-250. BECHARA, Evanildo. (2000). Moderna gramática portuguesa. Rio de Janeiro: Lucerna. CUNHA, Celso e CINTRA, Lindley. (1985). Nova gramática do português contemporâneo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. HAUY, Amini Boainain. (1987). Da necessidade de uma gramática padrão da língua portuguesa. São Paulo: Ática. MONTEIRO, José Lemos. (1994). A questão do se. In: id. Pronomes Pessoais: subsídios para uma gramática do português do Brasil. Fortaleza, EUFC. NUNES, Jairo. (1991). “Se apassivador e Se indeterminador: o percurso diacrônico no português brasileiro”. Cadernos de Estudos lingüísticos; Campinas (20), p. 33-59. ROLLEMBERG, Vera et al. (1991). Os pronomes pessoais e a indeterminação do sujeito na norma culta de Salvador. In: Estudos Lingüísticos e Literários; Salvador (11): 53-74. [1] Grifo nosso. Há aí um imprecisão terminológica que será discutida na seção seguinte. [2] Grifo nosso. Note-se, mais uma vez, a imprecisão terminológica. Compare-se com a nota 1. |
||||||||||||||
COMO CITAR ESSE ARTIGO SANTOS, Gredson. Questões sobre a “indeterminação” do sujeito. In: Revista Inventário. 5. ed., mar/2006. Disponível no web world wide em: http://www.inventario.ufba.br/05/05gsantos.htm.
|